sexta-feira, 22 de maio de 2009

DESABAFOS DE UM PADRE DE ALDEIA

DESABAFOS DE UM PADRE DE ALDEIA

Não sou Dr., nem Cónego nem Monsenhor, sou um simples padre de aldeia, padre inexperiente e novo, que nesta Quinzena das Vocações decidiu partilhar convosco alguns pensamentos desorganizados...
Já há muito tempo que se vem chorando a crescente “crise” nas vocações consagradas; choram os leigos e chora a hierarquia. No entanto, não estamos interessados em analisar as verdadeiras causas desta carência nem em dar remédio a essa carência. Deixou Deus de chamar? De certo que não!!... Por isso, nem gosto muito do termo “crise nas vocações consagradas”, prefiro antes “crise dentro da família”.
Diz o nosso povo na sua sabedoria que “ninguém ama o que não conhece”. Como podem os jovens amar um Deus que desconhecem por completo? Como pode uma criança sonhar ser o rosto vivo do Bom Pastor se os seus pais e familiares não lhe mostram esse rosto? Qual é a família da nossa ilha ( mesmo crente e praticante) que tem coragem de dizer como São João Bosco dizia: “O maior dom que Deus pode dar a uma família é dar-lhe um filho sacerdote.”
Nunca se rezou tão pouco, nunca se falou tão pouco de Deus nas nossas famílias, nunca se deu tão pouca importância à Eucaristia em família, como no nosso tempo...
Os padres e as religiosas não caem do Céu, nascem no seio de famílias que tentam ser cristãs (famílias cristãs a sério, onde o padre é um irmão entre irmãos). Se há poucos padres é porque estão a faltar na Igreja famílias desse calibre.
Um dia sonhei ser padre... porque me ensinaram que o padre é: um homem, que sendo baptizado procura configurar a sua vida à imagem do Bom Pastor e, principalmente, com a Boa Nova (Evangelho). Procura ser na sua comunidade “homem de Deus, homem dos homens, homem de oração, homem de esperança, homem da inquietação, homem da gratuidade.” A sua realização está em conseguir viver todos esses aspectos, o que se torna muito dificil nos dias que correm: Homem de Deus num mundo cada vez mais ateu e indiferente, em comunidades onde as Eucaristias são cada vez menos frequentadas, em comunidades onde a maioria das acções que se realizam tem muito pouco de evangélicas e muito de religiosas; Homem dos Homens, em comunidades em que o padre por vezes sente-se mais como um peso do que como um irmão entre irmãos. Homem de oração, em comunidades em que o padre só é bom se promove muitas iniciativas (restauros, pinturas, consolidaçãos dos templos) e acções pastorais e burocratas. E poderíamos continuar...
Muitos padres abandonam o sacerdócio porque acabam por estar suspensos entre a terra e o céu. Os padres são Homens! Em vez de julgar pensemos nas suas dores: tremenda e profunda solidão misturada com a falta de reconhecimento das comunidades a quem doam sua vida. Como pode o padre amar se não se sente amado? Uma vez, era eu padre novo, disseram-se: “o Sr. Padre é que precisa disso para viver, nós não...” Senti-me imensamente mal... Não será este o pensamento de muitos Cristãos? Por isso, fazer choradeira dizendo que há falta de padres? Não! Eu digo que é um milagre ainda haver padres e religiosas, isto sim!
Não quero ser pessimista: eu sou padre e tudo o que aqui partilhei tenho sentido na pele desde o dia em que fui ordenado: abandono e tremenda solidão, não só por parte dos leigos mas também por parte dos colegas. A Igreja precisa de mudar, “dar respostas novas a problemas novos”! Acusam-nos, e têm razão muitas vezes, de dar respostas velhas aos problemas novos do nosso tempo.
Termino com um pensamento que li num cartaz em Roma:
“OS PADRES AJUDAM MUITA GENTE. AJUDA TU TAMBÉM O TEU PÁROCO!”

terça-feira, 19 de maio de 2009

TU PODES

terça-feira, 12 de maio de 2009

Não à sorte de varas, não às toiradas

Porque "os animais são criaturas de Deus..."



Quem me conhece sabe que sou contra qualquer tipo de violência seja contra o quê ou contra quem for. Sou contra as touradas e sou, claro, contra a sorte (azar para o touro) de varas. Não inventem modas, tradições que nunca o foram nem nunca serão nossas e ainda por cima são retrógradas, violentas e sem sentido. Senhores deputados tenham coragem de dizer não, de não se deixarem manipular por lobbies económicos que de culturais nada têm.

quarta-feira, 6 de maio de 2009

Um perfil de pastor que valia a pena seguir

Mais uma vez faço minhas as palavras de Cipriano Pacheco, Vigário Episcopal em S Miguel

imagem retirada da net

"Num mundo como o actual, em que cada pessoa aspira à sua liberdade e em que cada qual deseja o seu desenvolvimento pessoal, a imagem bíblica de “Pastor” e de “rebanho”, de que falou o “domingo do Bom Pastor”, corre o risco de ser vista como desadequada ou mal entendida. Não falta quem tenha dificuldade em rever-se na imagem de um “rebanho”, como se tivesse apenas de deixar-se conduzir sem exercer a sua própria liberdade.

A verdade é que, na tradução bíblica, os reis e dirigentes eram comparados a pastores. E, no tempo de Jesus, trata-se de uma missão importante e, por vezes, perigosa. Cabe ao pastor vigiar e cuidar do rebanho, mesmo com o risco da própria vida. É nesta perspectiva que se entende o recurso que o evangelista faz à imagem do “pastor” e do “rebanho” para, numa parábola, a aplicar a Jesus. Mas, neste caso, enriquecendo-a com elementos novos, de modo a pôr em evidência a novidade de um tipo de relação qualitativamente diferente de testemunhadas por Jesus e a vigorar entre os seus seguidores.

Assim, o relacionamento instaurado entre Jesus e os que estão ao seu cuidado não é marcado pelo interesse, ou consciência pessoal, mas pelo amor. Por aqui passa a diferença entre o “Bom Pastor” e o “pastor-mercenário”. O primeiro conhece cada um dos seus e é conhecido por eles, enquanto o segundo desconhece-os, limitando-se ao puro e frio exercício de uma função. Ora, sabendo nós que, em linguagem bíblica, o conhecimento implica amor, está tudo dito em termos de originalidade do relacionamento cristão. Diante do risco ou do perigo, quando está em causa a defesa da humanidade, objecto do seu amor, Jesus não foje, dispondo-se mesmo a “dar a própria vida”, ao contrário do que é próprio de um “mercenário”.

Deste modo, a beleza de Jesus como Pastor deixa um “aviso” para a igreja, enquanto “redil” onde se reúnem os seguidores da mensagem de Jesus. Sendo a Igreja o espaço onde tanto se fala de “pastoral”, impõe-se que, no exercício de uma tal vocação e missão, ela se reveja ao espelho do perfil pastoral de Jesus, definindo-se como comunidade centrada à volta de Jesus e da escuta da sua Palavra, como condição para se deixar conduzir por Ele. Pode dizer-se que o perfil pastoral de Jesus deixa duas indicações claras à comunidade eclesial. Uma indicação aponta para a qualidade do relacionamento a existir no interior da comunidade cristã constituída e que deve distinguir-se pelo conhecimento mútuo, marcado pela proximidade própria do amor e da ternura. Outra indicação aponta para a abertura da comunidade constituída ou da Igreja, capaz de “sair” para fora de si mesma, ou do seu “redil”, não se fechando sobre si própria, pensando ter o exclusivo domínio do “rebanho” do Pastor e dos seus limites. É que, como diz o próprio Jesus, há muitos mais que, não estando no “redil”, são igualmente, pertença do Pastor, cabendo à comunidade cristã e eclesial ir ao seu encontro, criando condições para que, mesmo fora do “redil”, ouçam a voz do Pastor e “se deixem conduzir por Ele”.

Ao contrário de uma “seita”, uma verdadeira Igreja abre-se ao mundomediante um amor não restritivo, antes, aberto a todos, judeus ou pagãos, católicos ou protestantes, praticantes ou não praticantes, tanto justos como pecadores. O desígnio pastoral de Jesusé o de que, seja lá quem for, “ninguém se perca”."


Jornal Diário 2009-05-04 09:45:00