quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

MENINO À JANELA

Só faz sentido festejar o Natal se o centro da festa for o MENINO que nos foi dado, Emanuel, "O Menino envolto em panos e deitado numa manjedoura", o Principe da Paz.

Este movimento dos estandartes está a constar de apelos de Párocos de muitas paróquias entre elas a de Vila do Conde onde participei em Eucaristias. O apelo essencial é o de "abafarmos" o comercialismo em que se transformaram os festejos natalícios com a exposição de estandartes com o Menino e com a promoção da execução de presépios públicos.

Da Agencia Ecclésia declarações de António Rego


"Menino à janelaNa entrada em vigor do Tratado de Lisboa, não podemos deixar de saudar o seu capítulo XVII que «reconhece o contributo específico das Igrejas na integração europeia, bem como o contributo vital que prestam à vida social e cultural dos diferentes Estados membros»

Não é iniciativa oficial da Igreja nem de Espanha nem de Portugal. A ideia surgiu entre nós no Facebook. E propõe uma operação simples: colocar na janela ou na varanda um pequeno estandarte vermelho com a imagem do Menino Jesus. Apenas isso, na época do Natal.

Para dar visibilidade ao Menino de Belém que anda substituído por tantos símbolos que nada são e nada dizem a não ser que há abundância de quinquilharias à venda em esquina próxima.
Não é de agora esta mistura do Natal com o comércio. Até se pode compreender, como se entende a proximidade de lojas junto dos santuários e que isso constitua uma oportunidade de as pessoas terem as suas lembranças e de quem vive do comércio possa recompor-se de eras difíceis como a que atravessamos.

Mas parece que de há uns anos a esta parte o problema tem outros contornos: algum silenciamento programático, ideológico, do religioso no espaço público. Empurrando-o exclusivamente para o privado e o individual, riscando-o mesmo da história. Os suíços acabam de referendar a proibição de construir no território minaretes (torres de mesquitas). Os crucifixos receberam ordem de expulsão dos lugares públicos, foi chumbada, no início, a referência ao cristianismo na “Constituição Europeia”.

Deve afirmar-se, para bem da fé e da sociedade, o Estado laico, o respeito pelas diferentes Confissões religiosas, os direitos das crenças minoritárias, a total ausência de proselitismo ou de intromissão religiosa na consciência das pessoas. Bem como uma informação aberta sobre os diversos credos, com um total respeito pela liberdade de cada um. Mas à sombra desse legítimo cuidado não se pode riscar da história o património dum povo, a afirmação de grandes valores assentes na natureza e nas aquisições históricas e religiosas - sem se negar a evolução, a inovação, os desafios novos do presente e do futuro.

É aqui que se situa a nobreza dum povo como o nosso que não destrói os Jeró-nimos para realçar a Torre de Belém, nem retira dos seus museus preciosidades de arte religiosa que são uma riqueza profunda de espiritualidade.

É este todo que precisa ser entendido para que o nosso futuro não seja cons-truído sobre um acrílico parecido com cristal. O Natal entra neste património espiritual.E uma vez que se esconde o nascimento de Jesus como facto central da história – da nossa história – pois que venha para a janela um estandarte que na sua humildade recorda a forma como, a contra corrente nasceu em Belém há 2000 anos, o Messias, o Filho de Deus, o Redentor, Aquele, sem o qual não entendemos a nossa história.

Na entrada em vigor do Tratado de Lisboa, não podemos deixar de saudar o seu capítulo XVII que “reconhece o contributo específico das Igrejas na integração europeia, bem como o contributo vital que prestam à vida social e cultural dos diferentes Estados membros”. E prevê um diálogo “aberto, transparente e regular entre as Igrejas e a União Europeia”. "

António Rego

sábado, 28 de novembro de 2009

As quatro semanas do «Advento» do Natal

Imagem e texto retirados das notícias da Agência Ecclésia

As quatro semanas do «Advento» do Natal

Este fim-de-semana marca o início do tempo do Advento, um dos denominados "tempos fortes" do ano litúrgico. A sua história, no Rito Romano, começa no Século VI, no sentido de espera jubilosa do Natal, e a sua pré-história remonta às Gálias e à Espanha dos fins do Século IV, como preparação ascética para o Natal e a Epifania.


No Século V o começo do Advento era na festa da Anunciação (18 de Dezembro - hoje, a Anunciação é comemorada em a de Março). Apenas no Século X o seu início passou a ser no Domingo, quatro semanas antes do Natal.


O tempo litúrgico de preparação para o Natal começa no domingo mais próximo da festa de Santo André Apóstolo (30 de Novembro) e abarca os quatro domingos seguintes. O primeiro Domingo pode começar desde o dia 27 de Novembro - o Advento terá 28 dias - até o dia 3 de Dezembro - como este ano, caso em que terá apenas 21 dias.


A "feliz expectativa" do Advento assinala de forma clara que o tempo da festa não chegou; aliás, no início do Cristianismo a palavra "adventum" (“parusia”, em grego) utilizava-se para denominar não a primeira vinda de Jesus, mas a sua vinda definitiva no fim dos tempos, como Senhor do Universo.


Quem participar nas celebrações dos primeiros três Domingos do Advento notará que esta perspectiva continua a dominar, com destaque para os profetas e para João Baptista. No entanto, a partir do dia 17 de Dezembro, a preparação do Natal fixa-se nos antecedentes próximos do nascimento de Jesus e na figura da Virgem Maria, com as célebres antífonas do "Ó" na Liturgia das Horas ou as tradicionais "missas do Parto", na ilha Madeira.


Do Oriente para o Ocidente
Apesar desse Tempo ser muito peculiar nas Igrejas do Ocidente, o seu impulso original provavelmente veio das Igrejas Orientais, onde era comum, depois do Concílio Ecuménico de Éfeso em 431 dedicar sermões nos domingos anteriores ao Natal, ao tema da Anunciação. Em Ravena, na Itália (onde era grande a influência Oriental) São Pedro Crisóstomo fazia esses sermões.


A primeira referência sobre o Advento é a do Bispo de Tours, França, chamado Perpétuo (461-490) que estabeleceu um jejum antes do Natal, que começava a 11 de Novembro (Dia de São Martinho de Tours). O Concílio de Tours (567) faz menção ao tempo do Advento, costume que se conhecia como a "Quaresma de São Martinho".


Este carácter ascético para a preparação do Natal devia-se à preparação dos catecúmenos para o Baptismo na festa da Epifania. Somente no final do século VII, em Roma, é acrescentado o aspecto escatológico do Advento, recordando a segunda vinda do Senhor e passou a ser celebrado durante 5 Domingos.


Um período de seis semanas foi adoptado pelas Igrejas de Milão e pelas Igrejas da Espanha. Na Itália somente aparece no século VI, quando foi reduzida, provavelmente pelo Papa São Leão Magno (590-604), para as quatro semanas antes do Natal.


O Advento é hoje celebrado com sobriedade e com discreta alegria. Não se canta o Glória, para que na festa do Natal os fiéis se unam aos anjos e entoem este hino como algo novo, dando glória a Deus pela salvação que realiza no meio de nós.
Pelo mesmo motivo, o directório litúrgico orienta que flores e instrumentos sejam usados com moderação, "para que não seja antecipada a plena alegria do Natal de Jesus".
As vestes litúrgicas (casula, estola, etc.) são de cor roxa, bem como o pano que recobre o ambão, como sinal de conversão em preparação para a festa do Natal, com excepção do terceiro domingo do Advento, Domingo da Alegria, cuja cor tradicionalmente usada é o rosa, para revelar a alegria da vinda do libertador que está próxima.


Lugar espiritual
Em 2008, na celebração inicial do Advento, Bento XVI citava um texto no qual Paulo exorta os cristãos de Tessalonica a conservar-se irrepreensíveis "para a vinda" do Senhor. Ali lê-se "na vinda" (en tê parousia), como se, frisou o Papa, “o Advento do Senhor fosse, mais que um ponto futuro do tempo, um lugar espiritual pelo qual caminhar já no presente, durante a espera, e dentro do qual precisamente ser conservados perfeitos em cada dimensão pessoal”.


“A palavra que resume esta condição particular, em que se espera algo que deve manifestar-se, mas que ao mesmo tempo se entrevê e se antegoza, é «esperança». O Advento é por excelência a temporada da esperança, e nele a Igreja inteira é chamada a tornar-se esperança, para si mesma e para o mundo”, disse.

Octávio Carmo

domingo, 8 de novembro de 2009

D. António Sousa Braga quer empenhamento mais esclarecido e comprometido dos cristãos


A Igreja Católica nos Açores celebra a partir do próximo dia 8 a semana da Diocese, num difícil contexto socioeconómico.
D. António Sousa Braga, Bispo de Angra, considera que a actual crise "não é só económica e financeira, mas também espiritual”. Em Nota Pastoral a respeito da semana da Diocese, este responsável assinala que o mundo em “profunda mudança e em grande crise” exige “um empenhamento mais esclarecido e comprometido dos cristãos na sociedade, com o testemunho de vida evangélica, que, promovendo valores de humanidade, torne possível uma sociedade mais justa e fraterna”.
A este respeito, D. António Braga lembra “o ideal de militância da Acção Católica, de que ocorre, a 7 de Novembro de 2009, os 75 anos de presença em Portugal”.
Citando a última encíclica de Bento XVI, Caritas in veritate, o Bispo dos Açores sublinha que “é preciso corrigir os mecanismos perversos da economia de mercado, com a lógica da gratuidade e da solidariedade, da partilha e fraternidade”.
A diocese de Angra está a celebrar os 475 anos da sua fundação (3 de Novembro de 1534 pela bula Aequum reputamos de Paulo III). O valor recolhido no ofertório do fim-de-semana de 7 e 8 de Novembro destina-se à Diocese, que “continua a envidar esforços, no sentido de saldar a dívida acumulada”.
No ano passado, o ofertório, realizado nessa mesma ocasião, rendeu 24.963 Euros. “Os tempos são difíceis e de crise” sublinha D. António Sousa Braga, apelando para “a entreajuda e partilha” ajudando “a saldar a dívida acumulada” pela Igreja nos Açores.
“Não podemos olhar para a Igreja, como uma instituição humana qualquer e muito menos com critérios meramente empresariais”, indica.
A Semana de celebrações engloba a realização do Conselho Diocesano de Pastoral (CDP) entre 6 e 8 de Novembro com o objectivo de “avaliar o caminho pastoral percorrido e propor prioridades para o próximo quinquénio”. Ao mesmo tempo, celebram-se os 150 anos do seminário episcopal de Angra, que no ano lectivo 2009/10 conta com 22 alunos.
"Não são grandes números, como antigamente, mas vamos equilibrando as forças. Temos de saber dar graças a Deus e, neste Ano Sacerdotal, redobrar a nossa oração e acção pelas vocações sacerdotais", assinala o Bispo de Angra.
In Agência Ecclésia
Nota Pastoral do Bispo de Angra
“SOMOS A IGREJA DE CRISTO”
1. De 8 a 15 de Novembro p.f., vamos celebrar a Semana da Diocese. No contexto da comemoração dos 475 anos da criação da Diocese de Angra (3 de Novembro de 1534). Será um momento especial de acção de graças e também de balanço e de revisão de vida, para continuarmos a ser sempre mais e melhor a Igreja de Cristo nos Açores.
Nesse sentido, vai realizar-se, no fim-de-semana anterior (6, 7 e 8 de Novembro), o Conselho Pastoral Diocesano, com o objectivo de avaliar o caminho pastoral percorrido e propor prioridades pastorais para o próximo quinquénio. Num mundo em profunda mudança e em grande crise. Que não é só financeira e económica. Mas também espiritual. A exigir um empenhamento mais esclarecido e comprometido dos cristãos na sociedade. Com o testemunho de vida evangélica, que, promovendo valores de humanidade, torne possível uma sociedade mais justa e fraterna.

Foi o ideal de militância da Acção Católica, de que ocorre, a 7 de Novembro de 2009, os 75 anos de presença em Portugal.
É o que nos recomenda o Papa Bento XVI, na recente Encíclica “Caritas in Veritate”: é preciso corrigir os mecanismos perversos da economia de mercado, com a lógica da gratuidade e da solidariedade, da partilha e da fraternidade. “Somos a Igreja de Cristo”: o Seu caminho é também o nosso caminho

Precisamente para sintonizarmos a nossa caminhada pastoral, em Igreja, Os Directores e Assistentes Espirituais dos Serviços Diocesanos de Pastoral vão reunir-se em Angra, nos dias 5 (à noite) e 6 de Novembro (todo o dia).

A 14 de Novembro, haverá nas Obras Católicas de Angra, o Encontro Anual dos Movimentos Eclesiais, que são, na actualidade instâncias eficazes de formação e de empenhamento cristãos.
Sempre dentro desta perspectiva de presença cristã no mundo e a concluir a Semana da Diocese, realizar-se-á a Assembleia Geral da Caritas Diocesana, no Lar Santa Maria Goretti (S. Pedro de Angra), de 13 (à noite) a 15 de Novembro.

Iniciamos a Semana da Diocese, no Domingo, 8 de Novembro, com o já tradicional Dia da Igreja Diocesana, que, neste quadro das comemorações dos 475 anos da criação da Diocese, assume um significado muito especial. Deve ser assinalado, em todas as Paróquias ou a nível de Ouvidoria. Como expressão de comunhão eclesial, o ofertório das Missas desse fim-de-semana destina-se à Diocese.

No ano passado, o ofertório, realizado nessa mesma ocasião, rendeu Euros 24. 963, 14 (vinte quatro mil novecentos sessenta e três euros e catorze cêntimos). Os tempos são difíceis e de crise. Demo-nos as mãos na entreajuda e na partilha! A Diocese continua a envidar esforços, no sentido de saldar a dívida acumulada. Mas a vida não pode parar. Paróquias do Pico e do Faial continuam empenhadas na reconstrução de igrejas e estruturas paroquiais. A Diocese, além dos encargos dos serviços centrais, está empenhada no restauro e ampliação do Centro Pastoral Pio XII em S. Miguel.

2. Neste Ano Sacerdotal, além de procurarmos acompanhar mais de perto a situação e condições de trabalho dos nossos sacerdotes, queremos empenharmo-nos mais na Pastoral Vocacional. A Semana da Diocese coincide com a Semana dos Seminários. Poderão enriquecer-se uma à outra. Queremos, pois, na Semana da Diocese intensificar a nossa oração e acção pelas vocações sacerdotais. E a Semana dos Seminários só ganha com o aprofundamento do espírito de Igreja e da sensibilidade pela Igreja Particular. Para isso muito tem contribuído o Seminário Episcopal de Angra, prestes a comemorar os 150 anos de fundação (Novembro de 1862).

Neste ano lectivo 2009/10, o nosso Seminário conta com 22 alunos, assim distribuídos: 2 no 6º ano; 6 no 4º ano; 4 no 3º ano; 2 no 2º ano; 4 no 1º ano; 4 no Secundário. Portanto, temos menos 2 seminaristas do que no ano passado, tendo presente que, no fim do ano lectivo passado, 5 completaram o curso e foram ordenados e 1 suspendeu a matrícula. Assim saíram 6 seminaristas e entraram 4. Não são grandes números, como antigamente, mas vamos equilibrando as forças. Temos de saber dar graças a Deus e, neste Ano Sacerdotal, redobrar a nossa oração e acção pelas vocações sacerdotais. A Semana dos Seminários é ocasião propícia para isso. Como o será também a Quinzena Vocacional, à volta do Domingo do Bom Pastor. Lembro que o ofertório em favor do Seminário Episcopal será feito nessa altura.

3. Concluindo, queria lembrar o princípio essencial da visão cristã da vida: o Primado da Graça. “Somos a Igreja de Cristo”: sinais e instrumentos do Mistério da salvação de Deus, que se realiza em Cristo, por meio da acção pastoral da Igreja. Como advertia o Papa João Paulo II, há uma tentação que sempre nos insidia: «pensar que os resultados dependem (unicamente) da nossa capacidade de agir e de programar. É certo que Deus nos pede uma real colaboração com a Sua graça (…), mas ai de nós, se esquecermos que “sem Cristo, nada podemos fazer” (cf. Jo 15, 5)» (Novo Millenio Ineunte, 2001, nº 38).

Não podemos olhar para a Igreja, como uma instituição humana qualquer e muito menos com critérios meramente empresariais. O cansaço e o desencanto, que às vezes nos invadem, devem-se, além do resto, a algum deficit de espiritualidade. Quando não se tem em conta o Primado da Graça – advertia o Papa João Paulo II - «não há que maravilhar-se se os projectos pastorais se destinam ao falimento e deixam na alma um deprimente sentido de frustação. Repete-se então aquela experiência dos discípulos narrada no episódio evangélico da pesca milagrosa: “Trabalhámos durante toda a noite e nada apanhámos” (Lc 5, 5). Esse é o momento da fé, da oração, do diálogo com Deus, para abrir o coração à onda da graça e deixar a palavra de Cristo passar por nós com toda a sua força: Duc in altum» (Id., Ibid.)!

«Faz-te ao largo»! Para o mar agitado da vida humana. Onde acontece a «pesca milagrosa».
Não podemos senão repetir, com e como S. Pedro, as palavras da fé: «À Tua Palavra, lançarei as redes» (Lc 5, 5). Com confiança e fidelidade.

+ António, Bispo de Angra
Angra, 15 de Outubro de 2009.

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

A ousadia da diferença num novo monaquismo


A ousadia da diferença num novo monaquismo


De Cipriano Pacheco em Jornal Diário




Falar de monaquismo ou de vida monástica nos tempos que correm pode fazer lembrar realidades religioso-cristãs do passado, próprias de tempos idos, porventura desadequadas ao mundo actual.Como noutros campos acontece, também neste assunto pode que as coisas não tenham de ser exactamente assim. Um sinal disso mesmo é o que se relaciona com a experiência do mosteiro de Boze, no Norte da Itália e do qual é prior Enzo Bianchi, um monge já muito conhecido pelos seus livros e intervenções em eventos do mundo cristão e católico.
Neste caso, estamos perante uma experiência monástica nova, na medida em que se trata de um mosteiro onde vivem mulheres e homens, católicos, protestantes e ortodoxos, o que, só por si, constitui a sua notoriedade e novidade.Tendo estado há pouco tempo em Portugal, a propósito da apresentação de um seu livro – Para Uma Ética Partilhada –, numa interessante entrevista ao Pe. de 6 de Outubro, conduzida por António Marujo, Enzo Bianchi insistia num tema que lhe é claro e cheio de pertinência para a Igreja nos tempos que correm. É o tema da “diferença cristã”.
Na referida entrevista, aquele monge chega a afirmar que os cristãos têm de ser “diferentes no viver”. Uma diferença à qual está subjacente um entendimento correcto e uma prática positiva e atraente da condição cristã. É o que se deduz das suas palavras na citada entrevista: “O cristianismo pode ser verdadeiramente uma obra-prima de vida humana. O cristão deve mostrar que a vida cristã é verdadeiramente bela, boa e feliz”.
Eis uma ousada proposta que muita falta faz a uma verdadeira imagem da existência cristã. O que pode é suscitar algumas questões. Onde e como viver ou deixar passar uma tal diferença no nosso mundo? É o assunto de que se ocupa um dos livros de Enzo Bianchi já traduzido nas edições paulinas, precisamente sob o título: “A diferença cristã”.Em relação ao lugar natural de vivência daquela diferença, a resposta dada na referida obra é peremptória: “O cristão só pode viver a própria fé mergulhando na história e na sua opacidade, nas suas contradições, nas suas problemáticas, e nunca evadindo-se da história, que é o lugar da manifestação da presença de Deus”. É por imersão no mundo que a condição cristã deve ser vivida. Não há lugar para a fuga ou para o ghetto.Por sua vez, em relação ao modo de viver ou fazer passar a dita diferença, a indicação deixada não podia ser mais clara: “Nesta imersão, porém, a comunidade cristã é chamada a viver uma diferença na qualidade das relações, transformando-se naquela comunidade alternativa que, numa sociedade conotada com relações frágeis, conflituosas e de tipo consumista, exprima a possibilidade de relações gratuitas, fortes e duradouras, cimentadas na mútua aceitação e no perdão recíprocas”. E acrescenta ainda: É a “diferença cristã”, uma diferença que pede hoje às Igrejas que saibam dar forma visível e “vivível” a comunidades plasmadas pelo Evangelho”.
Tudo leva a crer que é precisamente esta diferença que está a fazer falta ao mundo de hoje e que seria um precioso contributo a ser dado pela Igreja e pelos cristãos dos nossos dias para, como também é dito na mesma obra, “a edificação de uma cidade verdadeiramente à medida do homem”.

A sabedoria necessária ao exercício do poder

Foto de Ana Loura



A sabedoria necessária ao exercício do poder




De Cipriano Pacheco em Jornal Diário



Precisamente ontem, quando encerravam as urnas das eleições autárquicas, o povo português terminava um ciclo eleitoral importante para o seu presente e para o seu próximo futuro.
Por uma curiosa coincidência, no mesmo dia, os participantes da Liturgia dominical eram confrontados com um episódio bíblico significativo da vida de Salomão, o sucessor do célebre rei David.
Salomão parece ter sido um rei sonhador. Segundo o primeiro Livro dos Reis, quando ele sobe ao trono, Deus ter-lhe-á comunicado em sonho: “Pede-me o que tu queres, que eu te darei”. Então, o jovem rei formula o seu pedido, mais ou menos nestes termos: “Dá-me um coração atento, para que eu saiba governar o teu povo e discernir o bem do mal”.
Que bela oração para todos os que exercem qualquer tipo de poder!
Aí está uma oração que podia ser adoptada por todos quantos foram, nestes últimos actos eleitorais, chamados ao exercício do poder.
Como lembrava, ontem, o Livro da Sabedoria, aquela oração terá agradado a Deus, tendo sido por Ele escolhida, como se pode ver pelas palavras colocadas na boca de Salomão: “orei e foi-me dada a inteligência. Implorei e veio até mim o espírito da sabedoria. Preferi-a aos ceptros e tronos… Com ela, me vieram todos os bens”.
É bem possível que não seja fácil governar bem um povo. Exige uma sabedoria especial, na perspectiva de Salomão. É que, o poder, seja ele qual for, não deixa de ser um lugar de tentação. A experiência das governações humanas mostra-o bem. Até o próprio Jesus Cristo foi confrontado com a tentação do poder, preferindo recusá-lo, mesmo se, agindo assim, acabou perdendo muitos adeptos, que esperavam vê-lo enveredar pelos mesmos caminhos prestigiosos da força, do poder, do sucesso ou da autoridade absoluta.
Acontece que, do ponto de vista bíblico aqui em referência, o segredo de um modo outro de exercício de poder, exige uma sabedoria diferente, tanto mais necessária, quanto os tempos não são fáceis e o factor crise pressiona. Não se trata de uma sabedoria feita de especulações ou de jogos de interesses.
O sábio, biblicamente falando, é aquele que conduz bem a sua vida, procurando encontrar respostas adaptadas aos problemas que lhe são colocados. Para um rei ou para um homem do poder, ser sábio equivale a saber governar o seu reino, o seu país ou o seu povo. Ser sábio, dir-se-ia hoje, é saber colocar o bem comum, como bem de todos, incluindo o bem dos mais diminuídos ou desprotegidos, à frente do interesse pessoal ou do bem dos mais fortes.
Mais do que procurar a conquista do poder a qualquer preço, o desafio deixado a todos os que assumem qualquer tipo de poder é o de se disporem a exercê-lo com a sabedoria capaz de os orientar para a edificação de uma sociedade mais justa e digna, onde haja lugar para todos.
Oxalá que todos os recém-eleitos se abram a uma tal sabedoria.

2009-10-12 06:00:00

quarta-feira, 29 de julho de 2009

"Batei e abrir-se-vos-á..."


Hoje coloquei esta fotografia no meu portfólio do Mil imagens. O título poderia ter sido outro qualquer, mas foi exactamente "Batei e abrir-se-vos-á..." o que os meus dedos teclaram, os dedos e o coração. Um dos "pedidos" que o nosso querido Irmão Silêncio fez foi que sempre que passassemos perto do "Prisioneiro do amor" fossemos fazer-lhe um pouco de companhia. Durante muito tempo eu fiz do caminho que passa frente à capela do aeroporto o meu caminho, parava, entrava e ficava uns poucos minutos alí muitas das vezes apenas a olhar o sacrário, outras a resmungar e outras a pedir colinho e outras a dizer "desculpa, eu sei que mesmo quando resmungo, quando digo a frase que tantas vezes a minha Mãe dizia no meio das suas aflições "Jesus fazei com que eu te veja" nas minhas aflições eu sei que mesmo sem Te "ver" Tu estás pertinho, Tu me tens ao colo como nas "Pegadas na areia". Lembro-me muitas vezes do livro do Queiruga quando penso nas orações pedido, no Tu saberes melhor que ninguém o que preciso, mas sim, eu gosto de Te puxar de vez enquando a barra do Teu manto, de Te dizer: não Te esqueças dos que amo e hoje quando dei título a esta foto mal sabia que te iria mais uma vez fazê-lo, tu sabes..., sei que sabes...mas deixa-me pedir-te, deixa-me puxar-te a barra do manto, coloca no caminho dos por quem Te peço os Samaritanos que eles precisam, que estes se façam instrumentos da Tua vontade...Amen



Hoje, depois de ter colocado esta foto no Mil e antes de saber que iria ter as notícias que me fazem pedir-Te o que te peço fiz meu caminho o caminha da capela e foi tão bom estar alí em silêncio só a olhar-te Prisioneiro à nossa disposição, nós que tantas vezes passamos e não paramos. Obrigada por estares.


Santa Maria, 28 de Julho de 2009

segunda-feira, 29 de junho de 2009

S. Pedro e S. Paulo


A dupla: Pedro e Paulo imagem e figura da Igreja?
Hoje, 29 de Junho, a Igreja Católica celebra os apóstolos Pedro e Paulo. É uma celebração com a categoria de solenidade, indicando assim o lugar importante que aquelas figuras ocupam o lugar importante na vida e na história do Cristianismo, tendo ficado conhecidos como “colunas” da Igreja.Na verdade, de acordo com os textos cristãos, Pedro reagiu sempre como o primeiro do grupo dos Doze, terminando por receber de Jesus o encargo de “confirmar os irmãos na fé”. Por sua vez, Paulo, de quem acabámos de celebrar o “ano paulino” instituído pelo Papa para assinalar o aniversário do seu nascimento, não tendo feito parte do grupo dos Doze discípulos de Jesus de Nazaré, uma vez convertido, veio a tornar-se o impulsionador do anúncio do Evangelho como mensagem destinada a “todas as nações”. Não deixa de ser curioso o facto de Pedro e Paulo aparecerem associados na mesma celebração litúrgica. É que, tratando-se de duas figuras – chave da mesma Igreja, representam dois modos muito diferentes de ser, de estar e de se situar no exercício da respectiva missão no interior da mesma Igreja.São diferentes nas suas origens. Pedro vem de um meio muito popular, piscatório, social e religiosamente sem qualquer relevância. Paulo, por seu lado, vem de um meio social mais elevado que lhe permitiu uma formação pessoal, especialmente de carácter religioso, de nível considerável para o seu tempo.Tendo crescido ambos como membros da religião judaica, a religiosidade de Pedro talvez se pudesse designar como “popular”, como hoje se costuma dizer, enquanto marcada por momentos de entusiasmo ou de emoções, por vezes, tão fortes e radicais como passageiras. Com entusiasmo era capaz de afirmar a Jesus que, “mesmo que todos te abandonem, eu nunca te abandonarei”, do mesmo modo que, em momentos críticos, como por ocasião do processo de Jesus, o medo o levou a negar Jesus afirmando não o conhecer. Contudo, era capaz de chorar sobre os seus enganos que não o impediram de, com uma humilde confissão de amor ao seu Mestre, desta vez, sem pretensão de dizer que amava “mais do que os outros”, foram-lhe postas nas mãos as “chaves do Reino”. O percurso de Paulo foi diferente. A sua formação religiosa era apurada e de índole assumidamente judaica. Tinha algo do que hoje se poderia exprimir como radicalmente militante, ao jeito de um fariseu puro e duro, o que explica a sua conduta de perseguidor de cristãos, tal como também ajuda a perceber o ardor com que se devotou à fé cristã, após a sua conversão, tornando-se o “apóstolo dos gentios”.Personalidades com origens, modos de ser e percursos tão diferentes vieram a integrar a mesma Igreja tornando-se seus verdadeiros pilares. Mesmo no exercício do respectivo ministério apostólico, diferenças se mantiveram. Enquanto Pedro ficou como referência para a identidade da fé e da comunhão entre as diferentes comunidades, Paulo privilegiou a missão ao encontro da diversidade de povos e nações. Daí que tenham existido momentos de forte debate interno do que foi prova o Concílio de Jerusalém centrado sobre o problema da integração dos cristãos vindos do mundo pagão face aos oriundos da tradição judaica. O mesmo se diga da ocorrência de desacordo ou contestação, mesmo pessoal, quando Paulo, em relação a Pedro chega a dizer que lhe “resistiu na face” por achar dúplice ou ambivalente o comportamento de Pedro, quando junto de cristãos vindos do paganismo ou junto de cristãos de origem judaica.Deste modo, a associação destas duas figuras da Igreja de Jesus Cristo faz delas figura e imagem de uma igreja verdadeiramente cristã, isto é, una na sua fé e vária nas suas diferentes funções e vocações. Uma igreja em que a comunidade e unidade têm a ver, antes de mais, com Jesus Cristo e o seu Evangelho, pelo que as diferenças no seu interior não se anulam, antes se integram como condição e factor de enriquecimento e de qualidade evangélica indispensáveis a uma comunidade verdadeiramente cristã e eclesial.
2009-06-29 06:48:00


quarta-feira, 10 de junho de 2009

Preconceito

sexta-feira, 22 de maio de 2009

DESABAFOS DE UM PADRE DE ALDEIA

DESABAFOS DE UM PADRE DE ALDEIA

Não sou Dr., nem Cónego nem Monsenhor, sou um simples padre de aldeia, padre inexperiente e novo, que nesta Quinzena das Vocações decidiu partilhar convosco alguns pensamentos desorganizados...
Já há muito tempo que se vem chorando a crescente “crise” nas vocações consagradas; choram os leigos e chora a hierarquia. No entanto, não estamos interessados em analisar as verdadeiras causas desta carência nem em dar remédio a essa carência. Deixou Deus de chamar? De certo que não!!... Por isso, nem gosto muito do termo “crise nas vocações consagradas”, prefiro antes “crise dentro da família”.
Diz o nosso povo na sua sabedoria que “ninguém ama o que não conhece”. Como podem os jovens amar um Deus que desconhecem por completo? Como pode uma criança sonhar ser o rosto vivo do Bom Pastor se os seus pais e familiares não lhe mostram esse rosto? Qual é a família da nossa ilha ( mesmo crente e praticante) que tem coragem de dizer como São João Bosco dizia: “O maior dom que Deus pode dar a uma família é dar-lhe um filho sacerdote.”
Nunca se rezou tão pouco, nunca se falou tão pouco de Deus nas nossas famílias, nunca se deu tão pouca importância à Eucaristia em família, como no nosso tempo...
Os padres e as religiosas não caem do Céu, nascem no seio de famílias que tentam ser cristãs (famílias cristãs a sério, onde o padre é um irmão entre irmãos). Se há poucos padres é porque estão a faltar na Igreja famílias desse calibre.
Um dia sonhei ser padre... porque me ensinaram que o padre é: um homem, que sendo baptizado procura configurar a sua vida à imagem do Bom Pastor e, principalmente, com a Boa Nova (Evangelho). Procura ser na sua comunidade “homem de Deus, homem dos homens, homem de oração, homem de esperança, homem da inquietação, homem da gratuidade.” A sua realização está em conseguir viver todos esses aspectos, o que se torna muito dificil nos dias que correm: Homem de Deus num mundo cada vez mais ateu e indiferente, em comunidades onde as Eucaristias são cada vez menos frequentadas, em comunidades onde a maioria das acções que se realizam tem muito pouco de evangélicas e muito de religiosas; Homem dos Homens, em comunidades em que o padre por vezes sente-se mais como um peso do que como um irmão entre irmãos. Homem de oração, em comunidades em que o padre só é bom se promove muitas iniciativas (restauros, pinturas, consolidaçãos dos templos) e acções pastorais e burocratas. E poderíamos continuar...
Muitos padres abandonam o sacerdócio porque acabam por estar suspensos entre a terra e o céu. Os padres são Homens! Em vez de julgar pensemos nas suas dores: tremenda e profunda solidão misturada com a falta de reconhecimento das comunidades a quem doam sua vida. Como pode o padre amar se não se sente amado? Uma vez, era eu padre novo, disseram-se: “o Sr. Padre é que precisa disso para viver, nós não...” Senti-me imensamente mal... Não será este o pensamento de muitos Cristãos? Por isso, fazer choradeira dizendo que há falta de padres? Não! Eu digo que é um milagre ainda haver padres e religiosas, isto sim!
Não quero ser pessimista: eu sou padre e tudo o que aqui partilhei tenho sentido na pele desde o dia em que fui ordenado: abandono e tremenda solidão, não só por parte dos leigos mas também por parte dos colegas. A Igreja precisa de mudar, “dar respostas novas a problemas novos”! Acusam-nos, e têm razão muitas vezes, de dar respostas velhas aos problemas novos do nosso tempo.
Termino com um pensamento que li num cartaz em Roma:
“OS PADRES AJUDAM MUITA GENTE. AJUDA TU TAMBÉM O TEU PÁROCO!”

terça-feira, 19 de maio de 2009

TU PODES

terça-feira, 12 de maio de 2009

Não à sorte de varas, não às toiradas

Porque "os animais são criaturas de Deus..."



Quem me conhece sabe que sou contra qualquer tipo de violência seja contra o quê ou contra quem for. Sou contra as touradas e sou, claro, contra a sorte (azar para o touro) de varas. Não inventem modas, tradições que nunca o foram nem nunca serão nossas e ainda por cima são retrógradas, violentas e sem sentido. Senhores deputados tenham coragem de dizer não, de não se deixarem manipular por lobbies económicos que de culturais nada têm.

quarta-feira, 6 de maio de 2009

Um perfil de pastor que valia a pena seguir

Mais uma vez faço minhas as palavras de Cipriano Pacheco, Vigário Episcopal em S Miguel

imagem retirada da net

"Num mundo como o actual, em que cada pessoa aspira à sua liberdade e em que cada qual deseja o seu desenvolvimento pessoal, a imagem bíblica de “Pastor” e de “rebanho”, de que falou o “domingo do Bom Pastor”, corre o risco de ser vista como desadequada ou mal entendida. Não falta quem tenha dificuldade em rever-se na imagem de um “rebanho”, como se tivesse apenas de deixar-se conduzir sem exercer a sua própria liberdade.

A verdade é que, na tradução bíblica, os reis e dirigentes eram comparados a pastores. E, no tempo de Jesus, trata-se de uma missão importante e, por vezes, perigosa. Cabe ao pastor vigiar e cuidar do rebanho, mesmo com o risco da própria vida. É nesta perspectiva que se entende o recurso que o evangelista faz à imagem do “pastor” e do “rebanho” para, numa parábola, a aplicar a Jesus. Mas, neste caso, enriquecendo-a com elementos novos, de modo a pôr em evidência a novidade de um tipo de relação qualitativamente diferente de testemunhadas por Jesus e a vigorar entre os seus seguidores.

Assim, o relacionamento instaurado entre Jesus e os que estão ao seu cuidado não é marcado pelo interesse, ou consciência pessoal, mas pelo amor. Por aqui passa a diferença entre o “Bom Pastor” e o “pastor-mercenário”. O primeiro conhece cada um dos seus e é conhecido por eles, enquanto o segundo desconhece-os, limitando-se ao puro e frio exercício de uma função. Ora, sabendo nós que, em linguagem bíblica, o conhecimento implica amor, está tudo dito em termos de originalidade do relacionamento cristão. Diante do risco ou do perigo, quando está em causa a defesa da humanidade, objecto do seu amor, Jesus não foje, dispondo-se mesmo a “dar a própria vida”, ao contrário do que é próprio de um “mercenário”.

Deste modo, a beleza de Jesus como Pastor deixa um “aviso” para a igreja, enquanto “redil” onde se reúnem os seguidores da mensagem de Jesus. Sendo a Igreja o espaço onde tanto se fala de “pastoral”, impõe-se que, no exercício de uma tal vocação e missão, ela se reveja ao espelho do perfil pastoral de Jesus, definindo-se como comunidade centrada à volta de Jesus e da escuta da sua Palavra, como condição para se deixar conduzir por Ele. Pode dizer-se que o perfil pastoral de Jesus deixa duas indicações claras à comunidade eclesial. Uma indicação aponta para a qualidade do relacionamento a existir no interior da comunidade cristã constituída e que deve distinguir-se pelo conhecimento mútuo, marcado pela proximidade própria do amor e da ternura. Outra indicação aponta para a abertura da comunidade constituída ou da Igreja, capaz de “sair” para fora de si mesma, ou do seu “redil”, não se fechando sobre si própria, pensando ter o exclusivo domínio do “rebanho” do Pastor e dos seus limites. É que, como diz o próprio Jesus, há muitos mais que, não estando no “redil”, são igualmente, pertença do Pastor, cabendo à comunidade cristã e eclesial ir ao seu encontro, criando condições para que, mesmo fora do “redil”, ouçam a voz do Pastor e “se deixem conduzir por Ele”.

Ao contrário de uma “seita”, uma verdadeira Igreja abre-se ao mundomediante um amor não restritivo, antes, aberto a todos, judeus ou pagãos, católicos ou protestantes, praticantes ou não praticantes, tanto justos como pecadores. O desígnio pastoral de Jesusé o de que, seja lá quem for, “ninguém se perca”."


Jornal Diário 2009-05-04 09:45:00


terça-feira, 14 de abril de 2009

O protagonismo feminino nas narrativas da Ressurreição


De Cipriano Pacheco, Vigário Episcopal em S Miguel


O protagonismo feminino nas narrativas da Ressurreição

Ao contrário do que se levou a pensar durante muito tempo, um dos dados mais inovadores introduzidos pelo movimento cristão nos seus inícios, teve a ver com o lugar das mulheres nas primitivas comunidades cristãs.
O protagonismo feminino está bem patente nas narrativas da Ressurreição de Jesus. Quem prestar atenção aos textos evangélicos próprios da celebração da Páscoa pode aperceber-se disso sem grande dificuldade.
Estamos perante um facto tanto mais notável quanto se conhece o estatuto social e religioso da mulher no país e no tempo de Jesus, em que chegava a ser considerada dispensada de conhecimento aprofundado da Lei, ao mesmo tempo em que não era normal haver rabinos que tivessem discípulas. Aí está a razão pela qual não deixa de ser espantosa a presença efectiva e activa de mulheres no movimento de Jesus. Nesta perspectiva, um dos papéis mais relevantes do protagonismo de mulheres situa-se no que respeita ao encontro com o Ressuscitado, esse acontecimento fundador da fé cristã. É num tal contexto que o papel das mulheres como Maria Madalena e suas companheiras é posto claramente em evidência.Sabendo-se que a sepultura de Jesus foi feita à pressa devido à proximidade do dia de Sábado, nem sequer tendo direito aos cuidados habitualmente destinados aos defuntos, eis que, na madrugada do primeiro dia da semana, são aquelas mulheres que se deslocam ao túmulo para prestar ao corpo de Jesus os cuidados a que não tinha tido direito. Longe de pensarem em “ressurreição”, Madalena e as outras mulheres vão preparadas para fazer o que se fazia a um morto, de tal modo que a sua preocupação é saber como deslocar a “pedra” do túmulo. Elas caminham na “noite” e, eis senão quando, para grande espanto seu, encontram a pedra deslocada e o túmulo vazio. É caso para pensar que a Madalena e as companheiras fazem a experiência de mulher amada do Cântico dos Cânticos: “Procurei Aquele que o meu coração ama e não o encontrei” (Cf, 3,2).Diante do inesperado, são aquelas mulheres que partem a levar a notícia do Ressuscitado a Pedro e a outros discípulos de Jesus. Aí está a razão pela qual Madalena será designada, mais tarde, inclusive por Tomás de Aquino, como a “Apóstola dos Apóstolos”. Neste sentido, é bem possível que tenha razão o biblista Carlos Gil Arbiol quando, em entrevista dizia que “nos textos do Novo Testamento, nas primeiras comunidades, as mulheres tiveram um protagonismo que não tiveram em nenhum outro grupo.
Era a aplicação do princípio teológico de que em Cristo, como diz Paulo na Carta aos Gálatas, não há homem nem mulher, nem escravo nem livre, nem judeu nem pagão”, o que leva a protagonizar que, com base em inspiração nas origens do cristianismo, acabará por acontecer na Igreja “um protagonismo maior” da parte das mulheres.

domingo, 22 de março de 2009

Retiro na cidade- 22 de Março

Foto de João Santiago em Olhares

Um sopro de liberdade


A Palavra de Deus

13Irmãos, de facto, foi para a liberdade que vós fostes chamados. Só que não deveis deixar que essa liberdade se torne numa ocasião para os vossos apetites carnais. Pelo contrário: pelo amor, fazei-vos servos uns dos outros. 14É que toda a Lei se cumpre plenamente nesta única palavra:
Ama o teu próximo como a ti mesmo.

Carta de S. Paulo ao Gálatas, Cap5, 13-14 (Bíblia dos Capuchinhos)

A meditação

Nas suas cartas dirigidas aos primeiros cristãos, S. Paulo convida regularmente os seus auditores à liberdade. Pede-lhes que sejam filhos e não escravos, opondo a liberdade da vida cristã à servidão da Lei.

Com efeito, a antiga religião consistia principalmente em seguir-se todos os mandamentos, estritamente, sem questioná-los. Desde então, os cristãos, não deveriam desembaraçar-se de todas as leis e rituais? É necessário seguir as tradições, já que Jesus parece ter-nos libertado dos constrangimentos de uma lei demasiado rígida?

Poderíamos pensar que a liberdade consiste, para todo o ser humano, em poder fazer o que quer. Se o homem é livre, não deve ser submisso a uma lei, mesmo que ela seja boa! Ele deve ser capaz de escolher ele mesmo, com a sua inteligência e o seu coração, para fazer boas escolhas.
E além disso, é verdade que Deus correu este risco quando criou o ser humano: preferiu fazer de nós seres livres, em vez de máquinas que funcionam perfeitamente “redondas” Ao criar o homem à sua imagem, Deus fez a aposta de o deixar livre de conduzir a sua própria vida. Mas isso não quer dizer que o homem seja capaz de decidir ele próprio o que é bem e mal. Se o homem é uma imagem de Deus, isso significa que pode fazer o bem, como Deus, quer dizer dar a vida, participar na criação, que é boa. Deus é aquele que não faz mal.

Mas, quando eu fizer um mau uso da minha liberdade, eu tenho consciência de não estar de acordo com o que eu desejo no mais profundo de mim mesmo: a minha vida deixa de estar em paz, os meus laços com as pessoas que me rodeiam tornam-se conflituosos, complicados, desconfiados.

Finalmente, eu chego a desconfiar também de mim próprio, e mesmo de Deus. Já que Deus é «Todo poderoso», porque não me impediu ele de fazer ou sofrer o mal? Porque me deixou livre, se é para me confrontar com o fracasso?
Sabemos todos que não há resposta satisfatória à pergunta «porque sofro?» É particularmente verdade quando me sinto inocente, ou atingido por um mal de uma forma desmesurada ou sem razão. Mas misteriosamente, mesmo face ao sofrimento presente no mundo, nós sabemos que permanecemos livres, que dizer capazes de fazermos um bom uso da nossa liberdade.
Enquanto homem, eu continuo capaz do amor em toda as situações da minha vida; eu posso sempre ser renovado à imagem de Deus. Apesar do mal, e para além do mal, a fé empurra-me a esperar uma vida nova, o surgimento de um Bem muito maior. Mas então coloca-se uma questão: como posso atingir o bem, sendo verdadeiramente livre? Poderei ser libertado do mal, sem ser simplesmente submetido à Lei, dócil ou resignado?

A confiança em Deus é uma certeza sobre a qual posso fundar toda a minha vida: Deus não me abandonará! Se Deus me criou livre, e me deu o desejo de ser «perfeito como ele próprio é perfeito», é porque ele me ama como um pai, e me dá os meios de crescer em liberdade. Os mandamentos que ele propõe não são portanto um constrangimento ou um fardo. Porque que pai deixaria o seu filho fazer o que quer, sem lhe dar conselhos, sem o proteger contra os perigos? Assim as leis e a tradição, transmitida pela experiência aos homens, dão-me pistas e hábitos para procurar o que está bem e é bom, e evitar o mal.

No entanto, toda a criança, deve tornar-se adulto. O que Deus me faz desejar, não é contentar-me em seguir uma lei, mas a possibilidade de entrar na minha própria vida, partilhar o seu sopro, a sua respiração. Como numa relação de amizade, gratuita e desinteressada, esqueço-me um pouco de mim próprio, e a minha única alegria é de estar com ele. Amar Deus é amar viver com ele e como ele.

Ora a vida de Deus, é estar eternamente virado para os outros, como um pai que não vive senão para os seus filhos. É por isso que o amor de Deus não pode ser um olhar para dentro mas estar disponível para os outros.
Sou, então, verdadeiramente livre quando liberto dos meus pequenos desejos, posso viver segundo o meu maior desejo : entrar na intimidade de Deus, cuja vida consiste em dar vida aos outros. Por isso, não posso satisfazer-me em cumprir estes deveres, mas o amor de Deus e dos homens compromete toda a minha vida. Partilho a sede de Deus, que deseja simplesmente dar a vida, livremente, por amor; e a minha vida torna-se ela mesma fonte de vida, não somente para mim, mas para todos os irmãos que eu encontro.


segunda-feira, 9 de março de 2009

Retiro na cidade- 09 de Março

Imagem do Premier de cordée retirada da net

Deus, o “premier de cordée”


(nota da tradutora: premier de cordée é o cume granítico de uma cordilheira montanhosa nos Alpes, 3.308 metros de altitude)

A Palavra de Deus

«Jesus tomou consigo Pedro, Tiago e João e levou-os, só a eles, a um monte elevado. E transfigurou-se diante deles» Marcos 9, 2

A meditação

Para esta segunda semana, iremos retomar passo a passo o evangelho da Transfiguração escutado este Domingo. Iremos avançar versículo a versículo: um versículo por dia para alimentar a jornada.

O exercício concreto desta semana consistirá em ler e reler um só versículo por dia, mastigá-lo para lhe extrairmos uma «palavra» dirigida a cada um. Ouso mesmo propor que aprendamos de cor um versículo por dia para que no final da semana, saibamos o evangelho da Transfiguração de cor. Este texto poderia também acompanhar-nos até à Páscoa.

«a um elevado monte (montanha)»: As montanhas são numerosas na Bíblia: Montanha do Horeb onde Deus se revela a Moisés e depois a Elias, Montanha das Bem-Aventuranças, Monte das Oliveiras, até ao rochedo de Golgota onde Cristo é crucificado. A montanha, é o lugar de contacto entre o céu e a terra. Um lugar ideal para a transfiguração. A montanha, é também o lugar do desprendimento da planície, do quotidiano, de uma certa - ousemos a palavra - sensaboria. Como os apóstolos conduzidos ao «cume de uma montanha», deixemos a planície para entrarmos na intimidade de Deus que nós teremos, seguidamente apenas, de revelar aos nossos irmãos.

Exercício deste dia: Ler e reler este versículo, talvez mesmo aprendê-lo de cor, e entender o seu significado para mim. Qual é a montanha onde Deus me chama

domingo, 8 de março de 2009

Imagem retirada da net
Proposta de retiro quaresmal dos Dominicanos de Lille

A palavra de Deus

5Tomando a palavra, Pedro disse a Jesus: «Mestre, bom é estarmos aqui; façamos três tendas: uma para ti, uma para Moisés e uma para Elias.»
6Não sabia que dizer, pois estavam assombrados
. Marcos 9, 5-6 (Bíblia dos Capuchinhos)

Eu sei bem que tu me amas

A meditação

A transfiguração é na vida de Jesus um acontecimento fora de série, um acontecimento diante do qual é difícil não partilharmos da mesma admiração e do mesmo medo que sentiram os discípulos. Havia razão suficiente para perderem toda a postura. Tanto mais se sentirmos essa convulsão no nosso encontro com Deus.

Esta segunda semana de quaresma é talvez marcada para nós por esta perda de referências, esta convulsão na vida espiritual. Primeira semana: aí vamos nós, com o coração valente, cheio de energia. Tudo está bem. Depois chegam as primeiras desilusões, a impressão penetrante do tempo que passa demasiadamente lento e sobretudo a ausência de recompensa para os esforços bem intencionados. Esperará Deus outra coisa de nós ?

Eu gostaria de partir da palavra de Pedro relatada no evangelho para mostrar que a perda de referências faz parte do encontro com Deus. Ainda mais, ela não pode ter lugar sem «Mestre, que bom é estarmos aqui; façamos três tendas: uma para ti, uma para Moisés e uma para Elias.»
É simpático Pedro ter distribuído as tendas. Simpático porque completamente escalonadas. O evangelista não se priva de sublinhar: «de facto, ele não sabia o que dizer tão grande era o seu assombro». Que contraste entre o que diz Pedro e o que ele sente. «Que bom estarmos aqui?» pode aparecer quase como delicado, como se ele dissesse «mas claro, mas claro, estamos tão bem com vocês os três» mas quando na realidade, «tão grande era o seu medo»!

Dir-se-ia que Pedro fala a Deus por falar, para encher a conversa, sobretudo para não dizer que é ele quem está com medo. Não procuraria ele desajeitadamente esconder-se?
«Sabes bem que eu te amo» responderá por três vezes Pedro a Cristo que lhe perguntou «Pedro, amas-me mais do que me amam esses outros aqui?» depois da ressurreição, depois da sua tripla negação (Evangelho de João, Capítulo 21)
«Tu sabes bem que te amo». Frase terrível, que poderia soar quase como um censura- «mas enfim, tu sabes perfeitamente»- Se nós não sentíssemos que a frase mesma está impregnada de uma tristeza insondável pela visão humana. «Tu sabes bem que eu te amo», mas eis que tu sabes também que eu te reneguei. A tua pergunta vai buscar-me ao mais negro e mais perdido de mim mesmo.

O texto original do evangelho, em grego, é ainda mais terrível. A tradução francesa traduz sem diferença os dois verbos diferentes para designar o amor que é pergunta na pergunta de Cristo e na resposta de Pedro. Um só verbo em francês para amar, quando há dois em grego, um para designar amor forte, exclusivo e um outro para designar um amor mais banal. Simplificando, e colando ao texto poderíamos traduzir assim:
- Pedro, tu amas-me ?
- Tu sabes bem que gosto muito de ti.
Terrível a resposta de Pedro, de um homem que já não procura nem fugir, mudar. «Sim, eu gosto muito de ti», quer dizer «não muito», nada mais do que isto. Imagino um casal em que um dos conjugues diz ao outro «gosto muito de ti». O quê? Só isso? Há razões para a união colapsar.
O diálogo de Jesus e Pedro pode mesmo ser apresentado assim: «Pedro amas-me?»-«Mas tu sabes bem Senhor, tu sabes bem que eu não te amo».

Duas vezes mais, Cristo irá colocar a questão crucial: «Amas-me?» e Pedro irá responder de cada vez que «gosto muito dele». À terceira vez, Cristo irá perguntar tomando o termo que Pedro usou: «Pedro tu gostas muito de mim?» E o evangelista comenta: Pedro fica muito triste porque Cristo lhe põe a questão dessa forma.

A quaresma é talvez, no seu princípio pelo menos, o reconhecimento assustador que simplesmente nós «gostamos muito de Deus», ver que «nós não o amamos». Somos como Pedro, nós não «sabemos muito bem o que dizer», confundidos, voltados diante quem é Deus e quem nós somos, nós diante dele. Esta confusão faz parte da relação autêntica com Deus. Esta confusão do coração desculpado por não amar, este «e não te amo como tu me pedes» que nós podemos provar, quando é assumido, torna possível a nossa própria transfiguração. Ela deixa o próprio Deus amar em nós como devemos amá-lo.

Retomo o meu casalzinho de que um dos conjugues confessava simplesmente «gostar muito» do outro. A salvação de um tal casal não estaria na desculpa confessada desse pouco amor? O conjugue poderia dizer: «minha querida, não te amo muito, amo-te mal, mas apesar de tudo amo-te. Eu lamento o meu pouco amor mas aceita-o apesar disso.»

Quando Deus entra nas nossas vidas ; as nossas reacções nem sempre estão à altura. Será que alguma vez estaremos à altura do amor? Nós não o poderemos estar sem o socorro de Deus. O «tu sabes bem» de Pedro deixa o olhar de Cristo sondar plenamente o seu coração. Este «tu sabem bem» de Pedro vem de alguma forma responder a «ele não sabia o que dizer». Eu, eu não sei, mas tu, tu sabes. Pedro sabe que os movimentos do coração do homem não podem escapar ao seu mestre. Desta vez ele deixa-se amar ele próprio como é, ele o discípulo que ama Deus, que ama mas ainda não está apaixonado.

A nossa quaresma é bem sucedida, uma super quaresma? Um falhanço? Deus sabe-o por nós. A nossa vida cristã, o nosso caminho, a nossa quaresma é de qualquer modo um «Deus saberá», um «Deus sabe onde». Abandonemos hoje toda a presunção de nos colocarnos sobre uma qualquer escala espiritual no nosso amor por ele. Não seremos nós a ir a ele, mas ele que vem até nós.

Pedro, tu amas-me? Sim, senhor, eu sei bem que tu me amas

sexta-feira, 6 de março de 2009

Retiro na cidade- 07 de Março


Foto de http://www.revistaportuária.com.br/


A Palavra de Deus

24Em verdade, em verdade vos digo: se o grão de trigo, lançado à terra, não morrer, fica ele só; mas, se morrer, dá muito fruto. João, 12, 24 (Bíblia dos Capuchinhos)




Correr riscos e a esperança cristã




A meditação


Completar o que começámos, eis o que nem sempre está ao nosso alcance. Por vezes os nossos compromissos saldam-se em puros e simples fracassos… A paróquia em que investimos pode envelhecer, o projecto profissional que mobilizava as nossas forças pode descarrilar, aqueles em quem depositávamos confiança podem cruelmente nos decepcionar.


No entanto, qualquer que seja o resultado dos nossos compromissos, o que temos feito, dado e recebido, nunca é em vão. Será que ao assumirmos os riscos que temos tido, não tenhamos nós já aprendido onde encontrar a nossa verdadeira felicidade? É que apesar de podermos atingi-los imediatamente, nós aprendemos já a olhar na direcção certa: em direcção ao reino de Deus.


Deste reino, Deus é o rei. Ele é também o seu principal agente, e é pela relação com Ele que os nossos sucessos e os nossos fracassos fazem sentido. O verdadeiro centro das nossas vidas, então nós vemos isso, é o Espírito de Deus, que imprime em nós a esperança do Reino que virá. Este Espírito santifica os nossos corações e nos assegura que tudo o que façamos contribui já para fazer acontecer o Reino, tanto os nossos sucessos como os fracassos.


É ele, e só ele, que alcançará dar um sentido aos riscos que tomámos. Cheios desta esperança que ele nos dá, nós sentimos uma certa segurança propagar-se na nossa alma: ela dá-nos a força para esquecermos o caminho já percorrido, a boa ou a parte má, e para continuarmos a ir em frente.

quinta-feira, 5 de março de 2009

Retiro na cidade- 06 de Março


Foto retirada da net
Arriscar e suportar o imprevisto
A palavra de Deus

«Vinde a mim, todos os que estais cansados e oprimidos, que Eu hei-de aliviar-vos. 29Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração e encontrareis descanso para o vosso espírito. 30Pois o meu jugo é suave e o meu fardo é leve.» Mateus 11, 28-30 (Bíblia do Capuchinhos)

A meditação


Todos sabemos que a vida quotidiana é uma prova de fundo. As dificuldades podem a pouco e pouco fazer-nos esquecer o porquê de estamos empenhados neste ou naquele caminho: “Que faço eu aqui?”, arriscamo-nos a perguntar-nos um dia, quer sejamos um religioso no seu compromisso, um empregado no seu trabalho, um esposo no seu casal…

Cristo não quis que esquecêssemos a beleza dos riscos que tomamos ao querer transportar o fruto. Por isso nos ensinou, tanto em palavras como em actos, a perfeição da caridade. Se os obstáculos nos entristecem a alma, a paciência estará lá para curar a nossa fraqueza. Se nos empurram para a cólera, a doçura nos dará a paz. Se somos tomados pelo ódio, a humildade será o nosso baluarte, e se o desejo de vingança nos assola, poremos a nossa esperança na justiça.


Esta paciência, esta doçura, esta caridade que o Espírito de consolação gosta de meter no nosso coração nos momentos de prova, ensina-nos a grandeza da nosso vocação. Seja qual for o resultado dos riscos que assumimos, através de uma certa perfeição da caridade, aprendida dia após dia na escola do Cristo, nós gozamos já as primícias da vida eterna. Possa o Senhor não cessar de a renovar no nosso coração

quarta-feira, 4 de março de 2009

Retiro na cidade- 05 de Março


Correr riscos e moderar a audácia


A Palavra de Deus

31Ou qual é o rei que parte para a guerra contra outro rei e não se senta primeiro para examinar se lhe é possível com dez mil homens opor-se àquele que vem contra ele com vinte mil? 32Se não pode, estando o outro ainda longe, manda-lhe embaixadores a pedir a paz. Lucas 14, 31 (bíblia dos Capuchinhos)

A meditação


Um obstáculo, não é apenas o que nos faz parar : pode ser qualquer coisa que nos estimula, porque há em nós uma ímpeto que instintivamente nos empurra a enfrentar os obstáculos: a audácia. A audácia, é o gosto do risco, o gosto da aventura, o espírito de iniciativa… Esta audácia natural, é por exemplo o que empurra qualquer um a tudo deixar para viver o que o apaixona.


Para quem se quer lançar á conquista do Reino de Deus, e que sabe que isso implica arriscar-se, a audácia é primordial: como é preciso audácia a uma ordem religiosa para fundar um convento numa cidade, para trabalhar para montar a sua própria empresa, a um casal para acolher crianças -a qualquer um em mais cem outras circunstâncias.


A audácia é uma coisa boa e necessária, mas a sabedoria convida-nos a num justo meio termo. Que ela não se torne temerária nem inconsciente! Um sábio diria que agir prontamente, não é agir precipitadamente: a acção pronta é louvável, desde que a reflexão a preceda e que ela seja acompanhada de numerosos conselhos; mas agir precipitadamente, sem nos formarmos ou informarmos, sem sabermos onde vamos e até onde poderemos ir, não seria pecado por precipitação e imprudência? Que o Senhor me ajude a ter audácia, uma audácia verdadeira: uma audácia ardente, mas também justa e verdadeira, medida e duradoura!

terça-feira, 3 de março de 2009

Retiro na cidade-04 de Março


Foto de Ana Loura: A magnífica Capela Sistina
Tradução da proposta de meditação quaresmal dos Dominicanos de Lille em http://www.retraitedanslaville.org/

“Arriscar e ser generoso”

A palavra de Deus
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Dai e ser-vos-á dado: uma boa medida, cheia, recalcada, transbordante será lançada no vosso regaço. A medida que usardes com os outros será usada convosco.» Lucas 6, 38 (Bíblia dos Capuchinhos)
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A meditação
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A generosidade ! Nos tempos que correm temos pouco costume de falarmos na generosidade como uma das principais virtudes. A generosidade, é uma certa grandeza de alma. Antigamente para a designar, falávamos de “magnificência”. Ser magnificente, é querer realizar coisas grandes: é não olhar à despesa quando queremos ser generosos.
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Quando a ocasião o pede, a pessoa generosa faz as coisas magnificamente: nas celebração de um casamento ou de uma festa, por exemplo, ou nas construção de uma casa. Um esposo generoso quer a pureza e a sinceridade do amor conjugal. Um cristão generoso quer conceder o perdão àqueles que lhe fizeram mal.
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O que o homem verdadeiramente generoso procura como prioridade, não é ele próprio. Ele não desdenha o seu próprio bem-estar, é certo, mas ele procura também alguma coisa ainda maior que ele próprio: o bem da sua família, dos que lhe estão próximos, dos seus concidadãos, de todos aqueles que poderá ajudar, próximos ou longínquos. Ele vai mesmo até querer o bem do seu Deus! Ele coloca a sua honra ao fazer coisas belas porque ele quer amar com grandiosidade e generosidade.
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Na generosidade cristã, há como que um tentar transbordar na busca do que é apenas simplesmente grande e belo. É um aspecto da busca da santidade, que bane o medo e a mesquinhez, nos impele a correr riscos e a querer dar frutos. Não tenhamos medo de sermos magnificentes na nossa vida segundo o Evangelho

segunda-feira, 2 de março de 2009

Retiro na cidade- 03 de Março


Foto de Ana Loura
Tradução da proposta de retiro quaresmal para o dia 03 de Março em: http://www.retraitedanslaville.org/spip.php?sommaire&date=2009-03-03


"Arriscar-se e não ter medo"


A palavra de Deus
14Vós sois a luz do mundo. Não se pode esconder uma cidade situada sobre um monte; 15nem se acende a candeia para a colocar debaixo do alqueire, mas sim em cima do candelabro, e assim alumia a todos os que estão em casa. 16Assim brilhe a vossa luz diante dos homens, de modo que, vendo as vossas boas obras, glorifiquem o vosso Pai, que está no Céu.»

(Mateus, 5, 14-16 Bíblia dos Capuchinhos)


A meditação


O amor de Deus, o amor do bem que está em nós, queremos espalhá-lo à nossa volta: a glória de Deus, é que nós produzamos frutos.


Mas o pecado pode impedir ou distorcer o ímpeto profundo do nosso coração: podemos ter medo! Nós podemos ter medo de perder dinheiro por aquilo que é incerto, nós podemos ter medo de nos confrontar-nos com o que pensam as pessoas, nós podemos ter medo de todas as dificuldades imagináveis?


Frequentemente, então, no momento em que temos vontade de nos arriscarmos em fazermos o bem e avançar, nós sentimos também a timidez que nos assola: à força de imaginarmos o pior, é grande a tentação de permanecermos escondidos!


O medo em si não é mau: pode contribuir para nos ensinar as virtudes da coragem e da prudência. No entanto, que ele não nos faça titubear ao ponto de arrefecer o ímpeto do Espírito Santo! Nós devemos também aprender a temperar os receios, temos de ter constantemente desperta em nós a esperança de dar frutos para o Reino. Deus, ele próprio, nos assegura: «vós sois a luz do mundo»

Retiro na cidade- 2 de Março



Foto de Ana Loura
retiro quaresmal proposto pelos Dominicanos de Lille em: http://www.retraitedanslaville.org/


Correr riscos e converter-se



A Palavra de Deus


17Quando se punha a caminho, alguém correu para Ele e ajoelhou-se, perguntando: «Bom Mestre, que devo fazer para alcançar a vida eterna?» 18Jesus disse: «Porque me chamas bom? Ninguém é bom senão um só: Deus. 19Sabes os mandamentos: Não mates, não cometas adultério, não roubes, não levantes falso testemunho, não defraudes, honra teu pai e tua mãe.»20Ele respondeu: «Mestre, tenho cumprido tudo isso desde a minha juventude.» 21Jesus, fitando nele o olhar, sentiu afeição por ele e disse: «Falta-te apenas uma coisa: vai, vende tudo o que tens, dá o dinheiro aos pobres e terás um tesouro no Céu; depois, vem e segue-me.» (Marcos 10, 17-21 Bíblia dos Capuchinhos)


A meditação


Este jovem pergunta a Deus como fazer para ser feliz e ter a vida eterna. Então, a chave da felicidade, não é aquilo a que acordamos chamar de sabedoria? E a sabedoria não exige de nós que ajamos segundo a verdade e que sejamos justos nas nossas relações com os outros? É assim que Deus relembra primeiro ao jovem os dez mandamentos e o aconselha em seguida a dar as suas riquezas aos pobres.


Mas convertermo-nos à sabedoria não acontece sem obstáculos. Nós podemos ser tentados por coisas que nos seduzem sem razão. Nós podemos sentir repulsa em querer o que é justo, mais difícil, parece-nos demasiado custoso. É aqui que Deus nos chama a sermos fortes e a convertermo-nos apesar de tudo: a correr o belo risco de agirmos com rectidão mesmo quando vacilamos ainda em ver o que é bom, mesmo quando verdadeiros obstáculos cobrem a estrada da nossa felicidade.




Mas sobretudo, face a todas as dificuldades, não esqueçamos o que Deus nos diz: «vem e segue-me». Saibamos que é exactamente ele quem nos abrirá o caminho, uma vez que tenhamos dado o primeiro passo

Retiro na cidade- 01 de Março

Imagem retirada da net
Tradução da proposta de meditação para o retiro quaresmal do Dominicanos de Lile:
Correr risco em nome do Evangelho

A Palavra de Deus

12Em seguida, o Espírito impeliu-o para o deserto. 13E ficou no deserto quarenta dias. Era tentado por Satanás, estava entre as feras e os anjos serviam-no. 14Depois de João ter sido preso, Jesus foi para a Galileia, e proclamava o Evangelho de Deus, 15dizendo: «Completou-se o tempo e o Reino de Deus está próximo: arrependei-vos e acreditai no Evangelho.» (Marcos, 1, 12-15 Bíblia dos Capuchinhos)


A meditação

Para quem caminha na fé, para quem caminha em direcção à fé, os quarenta dias da quaresma são um tempo importante. Eles recordam-nos os quarenta dias que Jesus passou, por nós, no deserto há dois mil anos: foi lá que o Filho de Deus, enviado por Deus para nos salvar, começou a pregar o reino dos Céus, e é lá que também nós nos queremos encontrar para começarmos esta quaresma e recordarmo-nos daquele que nos salvou: Jesus Cristo, o Filho de Deus que disse: “Completou-se o tempo: o reino de Deus está próximo. Convertei-vos e acreditai na Boa Nova!».
Se o Filho de Deus veio para nos salvar, é porque nós estávamos perdidos no deserto. No princípio não existia com efeito nem deserto, nem apelo à conversão. Havia simplesmente o reino de Deus e o que Deus tinha preparado para nós.


No princípio, diz a palavra de Deus, Deus havia-nos criado «à sua imagem». Dando-nos um coração capaz de compreender e de querer, de reflectir e de amar, deu-nos muito mais do que deu à maioria das criaturas: Deu à nossa vida um sentido de cujo culminar seria Ele próprio. Em vez do deserto havia o paraíso. Quando olhamos uma paisagem magnífica, por exemplo, somos arrebatados pela glória que se revela na criação, isso não é estar no paraíso? Não é estar no paraíso, quando fazendo o bem à nossa volta, quando descobrimos o prazer infinito e a infinita felicidade que há em se ser bom? É assim que Deus nos queria semelhante a ele, na liberdade e no amor.


No princípio, Deus queria ser o sentido das nossas vidas, o que lhes dá o verdadeiro sabor. Ele queria que a nossa alma fosse cheia do conhecimento do que é belo, verdadeiro e bom. Dia após dia, ele queria tornar bela a nossa vida, até que estivessemos completamente transfigurados, que nos assemelhássemos perfeitamente a ele: ele aspirava a ouvir um dia esse grito de alegria saltar livremente do nosso coração, da nossa inteligência e da nossa vontade: “Tu sabes bem que te amo!”
.

Mas, de uma forma ou de outra nós sabemo-lo bem: também desde o princípio, desde Adão, o pecado entrou no mundo, e nós deixámos o paraíso. O pecado: não é a repugnância de colocar a nossa inteligência e a nossa vontade ao serviço de Deus, assim como ao serviço dos irmãos? Desde essa altura, desde que nós nos tornámos lentos a entender e a amar Deus, o coração que Deus nos tinha dado para conhecer a felicidade foi como que estragado, destituído do seu esplendor inicial


Talvez façamos mal em no lo negarmos, mas não nos falta reconhecer a doença de que sofremos: esta languidez, este torpor que sofre a nossa vida de fé? Será que não estamos a sofrer de cegueira espiritual? Ficamos agradecidos pelo que Deus preparou para nós? Contemplar e amar Deus, servi-lo, eis o que deveria fazer-nos profundamente felizes, mas atingidos pelo pecado, só muito dificilmente discernimos o que Deus quer e o que ele é: em vez do bem, nós somos levados a discernir o mal, em vez da felicidade a infelicidade.


É deste coração ferido, destes entraves a contemplar e a amar, que o Evangelho nos fala como de um deserto. O paraíso que Deus tinha preparado para nós criando-nos tais como no fundo somos, este paraíso tornou-se pouco a pouco um deserto povoado por animais selvagens, um lugar de solidão, de perdição e de desespero.
Assim é necessário que Deus intervenha de novo na nossa história, que ele se afunde nas areias sem fim, que ele nos faça redescobrir sobre a terra e no mais íntimo de nós, na nossa alma, no nosso coração, o paraíso que perdemos e ao qual nós estávamos portanto prometidos: o sentido da nossa vida, o Reino dos Céus.


É por isto que Deus nos deu o seu Filho, Jesus : para que ele nos ensine o caminho da verdadeira felicidade, da beatitude e da caridade, e que ele cure assim a nossa inteligência da obscuridade e do pecado. É para isso também que ele nos deu o seu Espírito Santo, o Paráclito: para que ele console a nossa vontade do que a aflige, e a purifique também do lixo que ela tem.
E finalmente, Deus foi ainda mais longe: morrer por amor por nós, e este sacrifício salvou-nos definitivamente. É na cruz que o nosso coração encontra enfim o seu repouso salutar: contemplar de rosto descoberto a perfeição do amor e do perdão divinos!


Revelando-nos através de Jesus o rosto do Pai e ressuscitando Jesus, morto por nós no madeiro da Cruz, é a nossa alma, o nosso coração, que Deus ressuscitou: fez reflorir a nossa inteligência e a nossa vontade, ele fecundou o deserto onde nós vivíamos como que desfigurados pelo pecado. Ele fez brilhar em nós o amor do Pai. E agora que pode ele esperar de nós? Simplesmente que arrisquemos entrar novamente nesse mundo para onde levaremos um fruto que permanece.
Ele apenas espera que assumamos o risco de partir à conquista do reino que ele nos franqueia e nos oferece, onde a sua graça nos precede e onde ele nos espera.

domingo, 1 de março de 2009

Retiro na cidade-28 de Fevereiro

Imagem tirada da net
Tradução da reflexão do Retiro dos Dominicanos de Lille no site: http://www.retraitedanslaville.org/
«Seja feita a Vossa vontade»
A Palavra de Deus
Já te foi revelado, ó homem, o que é bom, o que o Senhor requer de ti: nada mais do que praticares a justiça, amares a lealdade e andares humildemente diante do teu Deus.Miqueias, 6, 8 (Bíblia dos Capuchinhos)

A meditação
O terceiro pedido que nós endereçamos ao Pai é: «Seja feita a vossa vontade assim na terra como no Céu». A vontade de Deus não se nos impõe, nunca, compete-nos mais descobrir esta vontade que se exerce na nossa vida como um apelo, como uma corrente que nos orienta.
E este querer, é primeiro um desejo, um desejo amoroso que nós temos de reconhecer na pele e à medida em que o realizamos em obra na nossa vida. Ele não existe á priori , ou desde sempre, ele é-nos manifestado na media em que nós orientamos a vida no sentido do Evangelho. Trata-se exactamente de nos metermos no bom sentido deste desejo de Deus, do querer de Deus vindo modelar o nosso próprio querer. Este conhecimento íntimo do desejo de Deus resulta completamente da união com o Pai. Ele é-nos necessário para progressivamente entrarmos em comunhão com ele.
Esta comunhão é o fruto do Espírito Santo que nos é dado pelo Pai e pelo Filho para entramos na dinâmica do seu desejo. Este desejo procede do amor que os une, e não será este amor que é o segredo da vida de Deus no seio da Trindade, como é o último segredo que nos entrega Jesus na véspera da Paixão? «Como o Pai me amou, também eu vos amei»?O Espírito Santo liga o meu coração ao coração de Deus, e o meu coração aprende a bater ao mesmo ritmo que o coração de Deus. Realizar a justiça, amar a bondade, caminhar humildemente com o teu Deus, é exactamente o caminho que seguimos na viagem empreendida depois do nosso baptismo.

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

Retiro na cidade- 27 de Fevereiro




Imagem retirada da Net
Tradução da meditação do retiro quaresmal dos Dominicanos de Lille em: http://www.retraitedanslaville.org/

A Palavra de Deus



6O jejum que me agrada é este: libertar os que foram presos injus­tamente, livrá-los do jugo que levam às cos­tas, pôr em liberdade os oprimidos, quebrar toda a espécie de opres­são, 7repartir o teu pão com os esfo­meados, dar abrigo aos infelizes sem casa, atender e vestir os nus e não des­prezar o teu irmão. 8Então, a tua luz surgirá como a aurora, e as tuas feridas não tardarão a cicatrizar-se. A tua justiça irá à tua frente, e a glória do Senhor atrás de ti. ( Livro de Isaías, Capítulo 58, 6-8) (Bíblia dos Capuchinhos)

A meditação



Mensagem inquietante de Isaías, mensagem inquietante das Bem-aventuranças, mensagem inquietante do Reino que vem. O segundo pedido que dirigimos ao Pai é: «Venha a nós o Vosso Reino». O Reino do Pai é o resultado imediato da santificação do Seu Nome. O Reino tem um rosto: o rosto do Filho, o rosto dAquele que vem. E, ao mesmo tempo que nós O acolhemos, nós acolhemos uma ordem nova que é acompanhada de um imenso desejo: o desejo que a Sua presença nos habite. Ou, é pela via de um desprendimento e de uma libertação que nos vem o Reino. Jejuar, é libertar-se de tudo o que é recusa de dar, de partilhar. É descobrir que a vida só faz sentido dando. É uma abertura formidável em nós que coincide com a vinda do Reino. E este Reino vem com a sua liberdade das coisas terrenas: jejuar é libertarmo-nos das forças que nos atam e nos fecham em nós mesmos. É sair do nosso confinamento. Ele chega-nos com um rosto, o rosto do Verbo feito carne, do que bate à nossa porta, aquele cuja voz sobe em nós, nos nossos coração. É ouvir a voz daquele que nos diz: «Aquilo que fizestes ao mais pequenino dos meus irmãos, foi a mim que o fizestes.» O Reino, quando tiver chegado em nós, reveste-se de todas as formas da doação de nós próprios, do reconhecimento do outro, da construção da paz: e paz e verdade encontram-se, fundadas na Esperança invencível desse reino que vem.

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

Retiro na Cidade- 26 de Fevereiro

Traduçaõ da reflexão do dia de hoje em http://www.retraitedanslaville.org/

A Palavra de Deus

“Ai de mim, estou perdido, porque sou um homem de lábios impuros, que habita no meio de um povo de lábios impuros, e vi com os meus olhos o Rei, Se­nhor do universo!» (Isaías 6, 5)

Meditação
O primeiro pedido que fazemos ao Pai é: «Que o teu nome seja santificado!». É através desse pedido que se nos revela o rosto do Pai: um pedido que parece à primeira vista não dier respeito senão ao Pai, este Pai infinitamente santo, como se afirmássemos de uma vez por todas a Sua santidade
Com efeito, esse pedido envolve-nos e por assim dizer trespassa-nos o nosso próprio coração. O Nome do Pai só é santificado na medida em que é acolhido no nosso próprio ser. Nós temos que nos transformar nesses filhos que falam com o seu Pai. Toda a oração verdadeira e cristã a Deus passa necessariamente pela santificação do Seu nome e isso reflecte-se em nós próprios. Descobrir e reconhecer a santidade do Pai, entra no mistério do seu Nome inefável e três vezes santo, liga-nos à Sua santidade e por consequência santifica-nos a nós próprios.
«Santificado seja o Vosso nome» faz-nos perceber a presença de Deus, prepara-nos para acolher a revelação do Seu Rosto: liberta-nos do medo, este pedido constrói-nos e faz-nos existir. Permite que as nossas palavras cheguem até Deus mas recebendo primeiro a Palavra do “todo outro”. A nossa Fé levada à plenitude, coloca-nos em presença daquele que é inseparavelmente o Deus três vezes santo e nosso Pai. Reconhecer a sua santidade, é também ao mesmo tempo, entrar nesse caminho de louvor e adoração «em espírito e verdade»: conduzido pelo Espírito de Deus, ela faz-nos descobrir a verdade do rosto dAquele a quem, segundo os ensinamentos de Jesus, ousamos chamar “Pai”.

Tempo de oração- Retiro na Cidade


Todo o tempo é tempo de oração. Iniciamos, hoje, o Tempo de Quaresma, tempo de reflexão sobre o nosso caminho para o Pai, sobre qual é este caminho e como o percorrer. Aqui http://www.retraitedanslaville.org/ podemos fazer um retiro sem sairmos do nosso espaço físico de todos os dias. Infelizmente é em francês, o que nos limita. Em português (e obrigada pela informação à Maria) há retiros na Fraternidade Missionária Verbum Dei http://www.verbumdei.org/modules.php?name=Documentos&MODE=SHOW&PAGE=Retiros%20na%20Vida%20Diária

Abraço fraterno


Tradução da proposta de reflexão de hoje em http://www.retraitedanslaville.org/:


"Jesus disse aos Seus discípulos: “ Quanto ao lugar para onde Eu vou vós sabeis o caminho.” Tomé diz-lhe : “Senhor, nós nem sabemos para onde vais. Como saberemos o caminho?” Jesus diz-lhe: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida.”” (Evangelho segundo S. João, capítulo 14, versículos 4-5.)Se perguntarmos à maioria dos Cristãos qual o objectivo da sua viagem, muitos responderão: “mas de que viagem se trata?” E se lhe precisamos: “trata-se da viagem que iniciastes aquando o vosso baptismo…”, eles ficarão mais surpresos, ainda. É no entanto de uma viagem que se trata. Propomos-vos neste início de retiro que retomeis consciência desta dimensão da nossa vida cristã: Uma viagem que nos compromete a um caminho. Deste caminho, nós conhecemos o seu ponto de partida: o nosso baptismo. Porque o baptismo é uma Páscoa, uma passagem, a passagem dos Hebreus através do Mar Vermelho, a passagem de Jesus nas águas do Jordão, a nossa própria passagem pela Paixão e Ressurreição de Jesus. E esta passagem abriu ao povo Hebreu um caminho para o deserto onde esteve durante quarenta anos antes de entrar na Terra Prometida, para Jesus, um caminho para a Cruz e a Glória, para nós , este caminho que nós começámos a percorrer e que importa agora que reconheçamos.Onde estamos nós nesse caminho?A vida Cristã não se apresenta como uma estrada bem delimitada. Trata-se sobretudo de entrar no caminho, de abrirmos o nosso caminho cuja originalidade é que ele é totalmente nosso e que ele corresponde à nossa verdadeira capacidade de liberdade.A nossa existência familiar, profissional, política pode realizar-se segundo rotas bem determinadas por painéis de informação que é suficiente apenas seguir. Para a nossa vida cristã é preciso sair dessas estradas e entrar no caminho. E deste caminho, é preciso de imediato determinar a orientação, uma orientação mais fundamental que todas as outras que nos caracterizam aos olhos dos nossos contemporâneos.Esta orientação tem uma fonte, real, profunda, e essa fonte é a oração.Na oração, nós somos conduzidos a deixar tudo o que nos leva ao domínio do espectáculo, nós somos convidados a entrar num certo segredo. Escutemos Jesus sobre este assunto:« Quando rezardes, não sejais como os hipócritas: eles, para fazerem as suas orações, gostam de levantar nas sinagogas e nos seus átrios, para que sejam vistos. Em verdade, vos digo, eles já tiveram a sua recompensa. Para ti, quando rezares, retira-te para o teu quarto, fecha atrás de ti a porta, e ora ao Pai que está lá em segredo. E o teu Pai que vê em segredo te dará a recompensa.” (evangelho segundo São Marcos, 6, 5-6)O primeiro fruto da oração é que se opera uma conversão: nós temos que nos virar para este “Outro” que é o Pai. Esta conversão inicia toda uma simulação de nós mesmos: ela faz calar as vozes, os ruídos e faz-nos entrar no segredo e no silêncio. Retomemos ao ensinamento de Jesus: “Nas vossas orações não desfieis frases ocas como os gentios: eles imaginam que falando muito se farão escutar melhor. Não façais como eles porque o vosso Pai sabe bem o que vos faz falta antes que Lho peçais.”Se o Pai não precisa de ser informado das vossas necessidades, somos conduzidos a compreender e a fazer nossa a admirável fórmula de Santo Agostinho: “Na oração, não se trata de instruir Deus, mas de construirmos a nossa vida.”Simultaneamente descobrimos que este caminho que tentamos seguir não é outro senão o próprio Jesus, o Verbo feito carne, fonte verdadeira de vida.Onde nos leva o caminho assim identificado com a pessoa de Jesus? Ouçamo-lo ainda: “ Vós portanto, orai assim: Pai nosso que estais nos Céus, santificado seja o Vosso nome, venha a nós o Vosso Reino, seja feita a Vossa vontade.”Eis aqui definidos os três pólos dominantes desta jornada que iniciámos depois do nosso baptismo: através das nossas ocupações, nossas pesquisas, nossas actividades, nossos trabalhos e no complexo tecido das nossas existências, nada menos do que santificar o Nome do Pai, de acolher o Reino do Filho e cumprir a Sua vontade segundo o sopro do Espírito."

domingo, 15 de fevereiro de 2009

Abraão, o Hebreu de Daniel de Sá


Abraão, o hebreu


Os Hebreus. “Homens poeirentos”, o que talvez seja o significado irónico da palavra com que eram conhecidos. Caminhavam no pó, surgiam do meio dele, desapareciam entre nuvens de poeira. Nómadas, não tinham morada certa. A sua casa era uma tenda, a sua pátria era o deserto. Como outros povos que ainda não tinham encontrado um pedaço de terra que pudesse ser seu. Onde crescesse erva em abundância e a água jorrasse em permanência. Onde pudessem semear umas lentilhas ou uns grãos de trigo. Homens sem pátria, sem casa e sem Deus. Talvez prestassem culto aos deuses dos altares que encontravam no seu caminho de vagabundos.


Um povo sem deuses seus, sem um ao menos, era um povo incompleto. Como uma família sem pai ou sem mãe. Poderiam fazer um ídolo. Mas com que nome? Com que poderes? Para os proteger de quê e em quê, se de tanto eram necessitados? E seria mais um empecilho a transportar nas longas jornadas. De qualquer modo, saberiam sempre que ele teria sido fabricado pelas suas próprias mãos, que teria sido uma invenção sua. E compreendiam que a imaginação não faz a realidade.


Mas um dia, ou ao longo de vários dias, ou até durante anos sucessivos, por palavras ouvidas ou apenas no íntimo da sua mente, Abraão percebeu que alguém se lhe revelava. Alguém que se dizia o seu Deus e o Deus do seu povo. Um Deus sem imagem física, que nem sequer tinha um nome nem um rosto. Que caminharia com ele e com o seu povo, que estaria sempre com eles.


Os Hebreus foram-se afeiçoando a esse Deus desconhecido. Dele só sabiam que era o seu, e isso lhes bastava. Já eram, agora, uma família completa. Os outros povos talvez continuassem a escarnecer deles, mais ainda do que antes, por estarem convencidos de que tinham um Deus que não precisava de corpo nem de feições.


Deus tivera o cuidado de não dizer muito de Si mesmo. Nem sequer que era o único, que não havia outro fora dele. Porque Abraão, e sobretudo a sua gente, dificilmente acreditariam nisso. Vivendo entre povos que prestavam culto a muitos deuses, ninguém poderia imaginar que afinal nenhum deles fosse verdadeiro, e que o único era aquele que Abraão dizia ter-lhe falado. Um Deus menor, sem dúvida, como menor era o povo que o proclamava seu.


A fé de Abraão foi aumentando. E a sua confiança tornou-se ilimitada quando Deus cumpriu a promessa de Sara, sua mulher, lhe dar um filho apesar da idade já muito avançada. Ela chegara a compadecer-se tanto do marido que até lhe oferecera Agar, sua escrava egípcia, para nela gerar descendência.


Entretanto, Abraão já percorrera um longo caminho. Partindo de Ur, sua terra natal, e tendo passado por Babilónia e Mari, chegara a Haran. E fora aqui, onde, tal como em Ur, se adorava a mesma deusa que habitava a Lua, que começara a receber a revelação divina. Depois seguira para sul, porque Canaã era o seu destino. Terá passado por Karkemish, Alepo e Damasco, fixando-se em Siquém. Mais tarde, em tempo de uma grande fome, procurou refúgio no Egipto, que era o sonho de todos os famintos por causa da abundância de colheitas que cresciam nos aluviões do Nilo.


Quando regressou do Egipto, montou as suas tendas perto dos carvalhos de Mambré, junto ao Hebron. E aí ergueu um altar ao Senhor, como antes fizera num monte a oriente de Betel. Um altar vazio. E já então Melquisedec, sacerdote e rei de Salém, celebrara com pão e vinho uma vitória de Abraão contra os inimigos que tinham feito prisioneiro seu sobrinho Lot. E saudara o patriarca dizendo: “Bendito seja Abraão pelo Deus Altíssimo que criou os Céus e a Terra.”



Abraão terá percebido assim que o seu Deus de algum modo também Se ia revelando à inteligência de outros homens de boa vontade. E isso não lhe terá diminuído o amor ao Senhor, antes lhe haverá aumentado a admiração, talvez mesmo um honesto orgulho, de que o Deus que lhe manifestara a existência e prometera a protecção do seu povo era, afinal, o Senhor de toda a humanidade.


Daniel de Sá


Salmo 62(63)
Senhor, sois o meu Deus: desde a aurora Vos procuro. *
A minha alma tem sede de Vós.
Por Vós suspiro, *
como terra árida, sequiosa, sem água.

Quero contemplar-Vos no santuário, *
para ver o vosso poder e a vossa glória.
A vossa graça vale mais que a vida: *
por isso os meus lábios hão-de cantar-Vos louvores.

Assim Vos bendirei toda a minha vida *
e em vosso louvor levantarei as mãos.
Serei saciado com saborosos manjares *
e com vozes de júbilo Vos louvarei.

Quando no leito Vos recordo, *
passo a noite a pensar em Vós.
Porque Vos tornastes o meu refúgio, *
exulto à sombra das vossas asas.
Unido a Vós estou, Senhor, *
a vossa mão me serve de amparo