quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

30 anos entre os seus sem se fazer notar




30 anos entre os seus sem se fazer notar
O que ainda ontem a Igreja celebrava – O Baptismo de Jesus -, é o acontecimento que, nos evangelhos assinala o início da chamada missão pública de Jesus. O que é estranho é que uma missão tão especial, de cariz divino, vinda do céu, tenha sido inaugurada do modo como foi. O pregador João, o Baptista, pregava no deserto, à partida, um lugar próprio para poucos ouvintes e baptizava no rio Jordão aqueles que o procuravam. Por sua vez, Jesus estava há já cerca de trinta anos nos meio dos seus conterrâneos sem que ninguém se tivesse apercebido de ali se encontrar alguém especial, apesar de ter algo parecido com o pregador do deserto. É que, também no caso de Jesus, em lugar de se instalar em Jerusalém, a cidade do seu antepassado David, escolheu uma aldeia desconhecida, numa terra meia pagã, a Galileia. Quem é que iria adivinhar a sua presença do Messias prometido por detrás do filho do carpinteiro? E, como se não bastasse, também Jesus vai colocar-se na fila dos pecadores que se apresentam para serem baptizados por João, sem nada que o distinguisse dos outros. Apresenta-se como um pecador entre pecadores. O inesperado é que, é numa tal circunstância, quando é baptizado por João nas águas de Jordão, que os evangelhos revelam a missão de Jesus, dizendo que, naquele momento, “os céus se abriram e o Espírito desceu sobre Ele fazendo-se ouvir uma voz do céu que dizia: Este é o Meu Filho bem-amado, em que pus o meu enlevo”.Ao que parece, havia uma tradição judaica, segundo a qual, há muito que não havia profetas em Israel. Já Isaías se queixara: “Ah! Se rasgasses os céus e se descesses!” De facto, de Jesus se diz que viu “o céu rasgar-se” no momento do seu Baptismo. Na verdade, estando os céus fechados, estava também interrompida a comunicação entre Deus e os humanos. Mesmo a comunicação entre os próprios humanos se encontrava ferida. Também hoje, apesar da infinita multiplicação de meios de comunicação e na era do “virtual”, nem por isso, é sempre fácil uma verdadeira comunicação entre as pessoas e os povos. O individualismo que ameaça as relações humanas não desapareceu e as incompatibilidades tornam frágeis as relações a todos os níveis, desde a vida em casal, entre pais e filhos, entre grupos e sociedades e até entre nações. É essa incomunicabilidade que o Deus de Jesus não pode suportar. O envio de Seu Filho feito homem entre os homens estabelece relações entre Ele e os humanos. É assim que, Jesus, mesmo sem pecado, torna-se solidário com a condição pecadora da humanidade. Entra no Jordão, como entrará depois, na morte, descendo até aos infernos da condição humana. E é neste homem, Jesus de Nazaré, que se revela a plenitude do amor e a salvação de Deus. É em Jesus que o céu se rasga e se abre, porque nele se restabelece a ligação entre Deus e os humanos, permitindo que uma tal ligação de amor e intercomunicação passe às relações dos humanos entre si. A prová-lo, aí estão os encontros de Jesus com todos os homens e mulheres que se cruzaram no seu caminho. Nunca os rejeita. Acolhe-os e lança-lhes um olhar de infinita benevolência. Põe-nos de pé tornando-os capazes de se voltarem, de novo, uns para os outros, aprendendo a amar-se de verdade. Afinal, trinta anos entre os seus sem se fazer notar, parece que não são inúteis. Dizem-nos que é a partir da proximidade com as profundezas da condição humana e da vida das pessoas que a missão cristã se revela evangelicamente significativa e de verdadeiro alcance salvador.


In Jornal Diário

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