sábado, 28 de julho de 2007

"Deus é amor"




Ando "há séculos" a ler o livro do Teólogo galego Andrés Torres Queiruga, Recuperar a criação. Há séculos porque não é fácil de ser lido porque tem que ser entendido, para além do facto de ser uma tradução brasileira.



Ontem ao fim do dia, dei um saltinho à praia de Nossa Senhora da Guia em Vila do Conde e li mais umas linhas, junto ao mar.



O que li, não me surpreendeu pois foi dentro da "linha" de raciocínio que já conheço ser a de Queiruga, mas confesso que me abalou. Passo a vida a pedir ao Pai que me faça instrumento e a pedir a mim própria que O deixe, sempre, fazer-me instrumento pois sei que é preciso que eu queira: tenho sempre a liberdade de dizer que sim ou que não.



Queiruga deu-me uma visão nova da Parábola do Samaritano (Lc 10, 29-38) ao dizer:

" pela injustiça de certos homens, aí, à beira do caminho, está um ferido, sangrando e exposto à morte. Muitas vezes, ao ler ou escutar esta narração, prescindimos do protagonista mais radical e fundante: Deus. Aquele ferido é filho seu que ele ama - sem metáforas- com amor infinito e disposto a tudo, buscando salvá-lo a qualquer preço...

... Quando passa o sacerdote, é ele (Deus), que mediante sentimentos de compaixão, a partir do impulso à solidariedade, a partir da voz da consciência...convoca-o a vir em ajuda do seu irmão. Mas - e tal é o risco de Deus: a impotência histórica do amor ferido - Deus não pode nem quer forçar a liberdade: o sacerdote não faz caso, e o ferido continua sangrando, exposto à morte; passa o escriba, e ocorre o mesmo; finalmente, passa o samaritano, que sente o apelo, por ele deixa-se guiar e acode em ajuda ao doente. Neste momento Deus pode, finalmente, salvar aquele homem.

O samaritano é verdadeiramente a sua mão: sem ela, Deus nada poderia fazer..."


E mais adiante: "Deus nunca acontece de maneira tão profunda, intensa e pura como quando um homem ou uma mulher acodem em ajuda a outro homem ou a outra mulher. Não podia ser de outro modo, dado que "Deus é amor", e nas pessoas culmina seu movimento criador."

A revelação bíblica procede dessa intuição..."



Resumindo muito:

depende de cada um de nós aceitar ou não o Seu apelo, a missão de co-autores na história da salvação que nos quer confiar, ser a Sua mão, para que Ele aconteça. Sou livre de aceitar...ou de recusar...Como posso eu conscientemente recusar? Não posso, nem quero...




Amen


Os bold são da minha responsabilidade

8 comentários:

Anawîm disse...

Que alma tão bela… tão abençoada por Deus nestes caminhos de exílio do eterno abraço do Pai… alma que cruzou o caminho desse bendito, tão de Deus, Irmão Silêncio…
…vejo que és cruz, na cruz do meu Senhor…
que belo pensamento aqui tens…
quantas vezes as feridas do outro nos repugnam e nos afastam para longe do irmãos que caminham ao nosso lado...
somos tantas vezes esse sacerdote
somos tantas vezes esse Levita
somos tantas vezes esse samaritano...

mas, quantas vezes não vemos as nossas próprias feridas, que prendem os voos da nossa alma, e não sabemos ou não queremos gritar por auxílio…?
passam nos nossos caminhos os sacerdotes, os estudiosos da Palavra… os inesperados estranhos…
tantos, o nosso Deus envia ao nosso encontro, desejoso de nos curar, de nos abraçar… e nós, temendo olhar as próprias feridas não queremos cair no chão e gritar enfim por socorro…
quantas vezes não são mesmo os inesperados estranhos, os samaritanos da nossa vida…? a quem acabamos por suplicar por auxílio, e deles recebemos o abraço que nos faz lembrar o Abraço do Pai…

Agradeço esta partilha que me fez reflectir muito da minha vida
perdoa o longo comentário…

Abraços grandes, no Deus-Amante também sedento do nosso abraço, naqueles que Ele coloca a caminho connosco

C Valente disse...

por aqui passei e tambem gostei,
Saudações

Anónimo disse...

“Como posso eu recusar ser a mão de Deus?”
Boa questão, que colocas...
Não chega não fazer mal, ser aparentemente devoto, pacífico e cumpridor das leis menores; para recusar Deus, basta apenas...não fazer nada!
O sacerdote e o levita, porque foram impiedosos na inacção, tornaram-se cúmplices do salteador... Ou seja, quando nos deixamos arrastar por palavreado estéril, por mais encantatório que seja, sem agir em favor do outro, estamos a agredi-lo. Quando nos limitamos a encerrar-nos na nossa cela de amor-a-dois com o Senhor, fechando a porta ao irmão que bate ou pondo algodão nos ouvidos para O amarmos com mais intensidade, estamos a ser carrascos daquele que chora - aquele em cujo rosto o próprio Deus nos interpela.
O Senhor Jesus não nos deixou como modelo um samaritano que, apiedado, se limitasse à contemplação e à oração em favor do ferido. O Senhor Jesus recorreu ao exemplo concreto da mão que se estende e alivia, que usa os recursos da vida quotidiana, tal como sabe fazê-lo, que partilha os bens de que dispõe e zela pelo futuro do que sofre, para que supere a sua aflição.
Esta, para mim, é uma das mais tocantes lições do Mestre.
Diz o povo, na sua sabedoria, que nos foram dados dois ouvidos, dois olhos, duas mãos, mas uma só boca...
Deus precisa dos nossos olhos e dos nossos ouvidos para que o nosso próximo (todo e cada homem) se sinta compreendido e amado; precisa das nossas mãos para o socorrer... e da nossa boca para ensinar, também. Mas, para O louvarmos, quantas vezes em silêncio, deu-nos sobretudo um coração sensível, que bate e se condói e é motor subjacente aos actos...das mãos.

Lila

Ana Loura disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Ana Loura disse...

Querida Lilita, forte, muito forte o que escreves. Apontas o dedo à maioria de nós...Na página deste blog tem duas frases, uma de Luther King: "O que mais preocupa não é nem o grito dos violentos, dos corruptos, dos desonestos, dos sem caráter, dos sem ética. O que mais preocupa é o silêncio dos bons." e outra de D. Hélder da Câmara "Livra-me Senhor das mãos limpas e do mêdo de me comprometer"
que são assim como que minhas bandeiras. Como disse à anawin eu também sou vaso de barro impuro, mas eu peço ao Pai que me faça Seu instrumento e quando esse momento chegar eu o reconheça em quem precisa, eu seja dócil ao Seu chamamento e voluntariosa no cumprimento dos Seus desígnios

beijinho querida amiga, obrigada pela tua lucidez

Ana Loura disse...

Querido/a anawin (pobre de Deus como todos nós vasos imperfeitos de barro) tenho "tropeçado" em ti em vários sítios e lido quer comentários e posts. Somos frágeis, sim. Todos precisamos, uns mais do que outros, que quem passa por nós nos caminhos da vida se faça mãos do Pai, Samaritanos para que as nossas feridas da alma sarem para que possamos, por nossa vez, ser samaritanos, mãos do Pai para os outros. Mas muitas vezes, mea culpa..., caimos (e eu caio vezes sem conta) na autocomiseração e não vemos que ao nosso lado alguém desesperadamente precisa do nosso amparo. Difícil... Da teoria à prática vai, apenas, um gesto...quantas vezes basta apenas um sorriso. Obrigada pelo sorriso que me deixaste. Que a Trindade Santa te abençoe

Anónimo disse...

A gente interroga-se e interroga-se.

Quem se pode eximir de ser fermento na massa,luz no escuro,samaritano na misericórdia,pregador na dúvida,apóstolo da esperança,anunciador do amor.

Que mandato pode haver que não seja este?

Anónimo disse...

Deus é amor,por isso fomos criados à Sua imagem e semelhança.
Li esse livro em menos séculos...risos
Gostei de o ler,absorver e tirar as minhas conclusões.
Pouco tenho acrescentar ao que foi escrito por anteriores participantes.
Cada um é instrumento do Pai na missão que lhe é confiada,nos momentos que surgem no dia a dia.
Caír e levantar faz parte da pedagogia do Livro da Vida,agora desistir ou desanimar isso NUNCA!!!
Confiar sempre no Amor do Pai que sonda todos os corações.
Bjs